Douglas Reis nasceu em Guarulhos, SP, em 1981. É formado em Teologia pelo Unasp, campus Engenheiro Coelho, em 2002. Depois de um período como obreiro bíblico em Juiz de Fora, MG, São Luís, MA, e em São Paulo, casou-se (em janeiro de 2006) com Noribel Kirsch de Oliveira Reis (formada em Pedagogia também pelo Unasp). O casal foi chamado para Corumbá, MS, onde o pastor Douglas trabalhou como capelão do colégio adventista da cidade. Ainda em 2006, foram chamados para Itajaí, SC, onde ficaram até o ano passado. Em 2009, o pastor Douglas assumiu a capelania do Colégio Adventista de Joinville – unidade Saguaçu (CAJ). Mantem o blog Questão de Confiança e tem um livro a ser lançado pela Casa Publicadora Brasileira – Enfraquecido Pela Visão. Nesta entrevista concedida a Michelson Borges ele fala sobre a palestra que apresentou na Univille:
Como surgiu a oportunidade de falar sobre criacionismo no campus da Univille?
A princípio, a universidade havia convidado um palestrante de São Paulo para representar o criacionismo em um debate, durante os eventos em comemoração ao Dia do Biólogo. Uma vez que não conseguiram confirmar com ele, buscaram junto à educação adventista um representante do criacionismo. Pela proximidade de nossa unidade escolar com a Univille, foi-me feito o convite.
As palestras eram alusivas ao Dia do Biólogo. Como não biólogo, você preferiu falar sobre as cosmovisões que sustentam os modelos que tratam das origens. Por que resolveu ir por esse caminho?
Rubem Alves diz que a ciência moderna é uma deformação do senso comum. Essa é uma afirmação contundente, mas nos ajuda a pensar que, de alguma maneira, a concepção atual de fazer ciência não reflete o objetivo inicial dos primeiros cientistas, os quais buscavam uma forma unificada de conhecimento, sem descartar outras áreas do saber na busca de respostas para suas indagações. Acho oportuno refletir sobre nossas práticas científicas, questionando as motivações e verificando se as evidências favorecem nossa visão de mundo, ou se nos forçam a alterar a cosmovisão que abraçamos.
Por que intitulou sua palestra de “Evolução, criação e o making-off da ciência”? Que “making-off” é esse?
O objetivo era retomar contribuições da filosofia humanista à ciência, bem como ressaltar o impulso que o cristianismo deu à pesquisa científica. Quando falo de Humanismo, valho-me da classificação que Oss Guinnes usa em seu The Dust of Death, quando fala de três períodos humanistas: na Grécia antiga, na Renascença e durante o Iluminismo. Certamente, muito do aspecto antirreligioso que determinados cientistas apresentam se deve ao Iluminismo. As visões de mundo teísta e humanista formam um substrato, o qual precisa ser levado em conta, a fim de entendermos o modus operandi da ciência moderna. Conhecer os bastidores filosóficos da ciência ajuda a redefinir seu potencial e sua limitação.
Você falou sobre as contribuições do cristianismo para a ciência. Que contribuições foram essas?
O estudioso Paolo Rossi ressalta que a Reforma deu um aspecto redentivo à cultura; outros autores se referem ao “mandato cultural”, a ordem divina para criarmos cultura. Sob o impulso da Reforma, não só as ciências, mas as artes plásticas, a música, a filosofia e outras áreas da cultura ganharam um sopro de vida.
Especialmente no que se refere às ciências, a noção de um Deus que criou o Mundo, mas que não faz parte do mundo, desmistificou a natureza; se o mesmo Deus originalmente ordenara que o homem cuidasse da natureza, o que faz parte do conceito de mordomia cristã, conhecer a natureza e explorá-la era uma forma de cumprir essa ordem (como o filósofo elizabetano Francis Bacon frizava). Além dos fatores já citados, se Deus era definido pela Teologia como um Ser racional e o homem, por ser à imagem de Deus, possui racionalidade, entendia-se que a criação poderia ser compreendida racionalmente. Essas e outras proposições cristãs foram fundamentais para o desenvolvimento da ciência moderna.
Por isso você afirma que religião e ciência não são excludentes.
Sim. Os primeiros cientistas eram majoritariamente cristãos. Stephen Hawking, em livro recentemente lançado no Brasil, fala dos maiores cientistas de todos os tempos – e dentre os cientistas sobre os quais Hawking escreve, apenas Einstein não é propriamente um cristão (embora acreditasse em algum tipo de misticismo panteísta). Ainda hoje, cristãos continuam contribuindo com diversos ramos da atividade científica. Não há desarmonia entre religião e ciência, apenas entre religião cristã e ciência naturalista.
Você tratou das insuficiências do darwinismo? Quais mencionou?
O darwinismo possui um componente filosófico, o naturalismo filosófico. Essa visão de mundo encara o mundo físico como uma caixa fechada, sem a intervenção de nada externo (ou seja, sobrenatural). Isso traz problemas para determinar as origens da vida, por exemplo. Afinal, na melhor das hipóteses, a seleção natural explicaria o desenvolvimento de novas espécies a partir de outras espécies (coisa que, efetivamente, ninguém conseguiu provar exaustivamente); ainda assim, como explicar o surgimento da primeira vida?
A evolução não explica a chamada sintonia fina do Universo – ou seja, o ajuste perfeito das leis físicas, que tornam possível a vida humana. Uma leve modificação na gravidade ou na posição do planeta Terra em relação ao Sol, e não haveria vida como a conhecemos. Será que o equilíbrio delicado nas leis físicas, o qual surpreende os estudiosos, é resultado de mero acaso?
No campo epistemológico, o darwinismo inspira menos confiança ainda. Darwin expressou, em carta datada de 3 de julho de 1881, a desconfiança em relação à mente humana, sendo que esta descendia da mente de animais inferiores. Assim, não se pode conhecer nada, porque nossa razão não é confiável! Também caem por terra as bases morais da humanidade (não existem mais categorias como “certo” ou “errado”, pois tudo se torna “natural”, fruto de um determinismo biológico).
Fale um pouco a respeito da palestra de Marcos Ribeiro Balieiro, doutorando em Filosofia pela USP, convidado para defender o darwinismo.
Antes, preciso ressaltar que, embora fosse um debate, o clima foi de respeito amistoso. Marcos Ribeiro argumentou que, com o início do método científico (Bacon), com a ideia posterior de falseabilidade (Karl Popper) e o trabalho de Thomas Khun (A Estrutura das Revoluções Científicas), houve um desenvolvimento que descartou a concepção teísta. Após sua fala, vi-me forçado a lembrá-lo de que Bacon era um criacionista! Não só ele, evidentemente, mas muitos dos que ajudaram a construir a metodologia científica moderna também o eram. Entre eles, podemos citar Newton, Kepler, Pascal, entre outros. A argumentação é uma falácia genética – ainda mais porque, antes de Darwin, o filósofo Hebert Spencer já cunhava conceitos caros ao evolucionismo, como o conceito da “sobrevivência do mais apto” e de uma “gradual perfectibilidade dos seres vivos”. A mudança de paradigma se deveu mais a questões de preferência filosófica do que propriamente de evidências em sentido contrário.
Qual foi a reação do auditório às palestras?
A princípio, ficaram ressabiados a respeito do criacionismo; depois, boa parte dos alunos da faculdade que estavam presentes mostrou-se interessada em saber mais sobre o assunto.
Na seção de perguntas, quais mais lhe chamaram a atenção e por quê?
As perguntas iniciais do público se dirigiram a mim, uma vez que defendia a posição com a qual eles tinham menos familiaridade. Fui questionado sobre meus motivos para confiar na Bíblia, uma vez que, supostamente, diversas teriam sido as alterações (e adulterações) efetuadas no texto bíblico. Respondi que havia vários motivos para se confiar nas Escrituras, sendo um deles a descoberta dos pergaminhos do Mar Morto (a partir de 1947, em Qumran). As 11 cavernas continham manuscritos da comunidade judaica conhecida como essênios. As cavernas mais importantes, 1, 4 e 11, guardavam manuscritos bíblicos mil anos mais antigos do que os que havia disponíveis na época. Apesar de pertencerem a épocas distantes, os manuscritos não tinham diferenças essenciais significativas. Normam Geisler afirma que o texto bíblico que temos hoje possui mais de 99% de confiabilidade.
Também fui inquirido sobre a possibilidade de o criacionismo sofrer mudanças ou se ele estava fadado à estagnação. Nesse ponto, pude diferenciar as formas de se encarar ciência de suas bases epistemológicas. Tanto o criacionismo quanto o evolucionismo trabalham com hipóteses, levantamento de dados, aquisição de conhecimento, etc. Mas suas bases filosóficas não mudam. Citei que uma mudança que o criacionismo sofreu se deveu justamente à seleção natural - sabe-se hoje que os organismos podem apresentar pequenas mudanças (chamadas por alguns de microevolução), embora tais mudanças não gerem modificações tão profundas. A aceitação da seleção natural (de forma restrita) revela que o criacionismo, enquanto prática científica, pode e continuará a crescer, embora a base teísta-cristã não sofra alteração. O mesmo se pode afirmar sobre o naturalismo filosófico por trás do evolucionismo - ele não muda enquanto “crença”.
Em sua opinião, como o criacionismo deve ser apresentado nos campi seculares?
Acredito que a promoção de debates e o diálogo entre correntes diferentes de pensamento correspondem a oportunidades para que pessoas de mente aberta pesem as evidências por si mesmas, considerando qual posição aponta o melhor caminho. Para isto, mais cristãos, em diversas áreas, precisam se engajar e adquirir treinamento em apologia, a fim de apresentar “a razão de sua fé”, mas com “mansidão e temor” (1Pe 3:15).
No encerramento do debate, o moderador Tascísio Possamai (geólogo da Univille) disse que as portas da universidade estariam abertas para que adventistas participassem de debates futuros. A que você atribui essa abertura?
Ao poder de Deus. Minha esposa, Noribel, e a professora Odete Pasold, diretora do CAJ, estavam presentes e oraram o tempo todo. No fim de semana anterior, eu havia jejuado pelo assunto. Também no dia sofri de forte crise renal e estive durante algumas horas hospitalizado. A todo instante, Deus estava me dizendo que não seria pelo meu poder ou conhecimento, mas pela influência da Pessoa de Seu Espírito que as pessoas entenderiam algo sobre Ele. Este é o trabalho da apologia, no dizer de alguns estudiosos cristãos: ela não converte, mas funciona como catalisador, removendo barreiras de preconceito e antagonismo, para que o Espírito Santo trabalhe com a mente das pessoas.