terça-feira, novembro 13, 2007

Uma vida de louvor

David Wesley Silva nasceu em Rondonópolis, MT, em 24 de abril de 1970. Bacharel em Composição pela Universidade de São Paulo (USP), é maestro, produtor musical e regente. Fundou a produtora SOMMUS Assessoria & Marketing. Casado com Stefania Ribeiro Silva, tem três filhos: David Wycleff, de 5 anos; Steven Daniel, 3; e Ian Victor, 1. Nesta entrevista, concedida a Michelson Borges, fala sobre carreira, testemunho, estilo de vida, milagres e, claro, música.

Fale um pouco sobre o seu trabalho.

Dirijo quatro corais: o do SBT, da TetraPak, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e o Chorus Dei, da igreja do Iasp. Produzimos CDs, criamos comerciais, jingles e spots para várias empresas. Tenho uma agenda que, excetuando os corais, muda sempre. O que mais requer do meu tempo é o Chorus Dei, que é instrumento de união da nossa igreja e de crescimento musical e espiritual. Sobrando um tempinho, viajamos pelo Brasil cantando ou pregando.

Como evangelizar no ambiente de trabalho sem ser agressivo ou inconveniente?

Por exemplo, no SBT o clima de exaltação dos egos na tela acaba muitas vezes passando para alguns colaboradores e departamentos. Mas o coral é para unir as pessoas. Ter aquele tato de Jesus, aquela palavra e jeito certos, é nosso desafio. Sei que, se Ele conseguiu, foi para me mostrar que também posso. Então, meu segredo é: eu oro com eles! Vou direto à fonte! Desde o primeiro dia, no estúdio do Ratinho, convidei todos para uma prece. Desde então, há sete anos, todas as semanas oramos lá. Peço ao Senhor proteção e sabedoria. Dois anos atrás, o SBT teve muitos cortes. Cortaram todos os projetos do RH, menos o coral. Muitos falaram: “Só por Deus, maestro!” Oramos todos juntos agradecendo.

Mencione outro resultado feliz dessa sua postura missionária.

Montei um concerto no Teatro Imprensa, em São Paulo. Centenas de pessoas puderam ouvir sobre 1 João 4:8, entre as músicas. Foi poderoso! Entre todos os que nos aplaudiam em pé, estavam Cynthia Abravanel e a cúpula do SBT. O mais marcante, para mim, foi que após me trocar, quis dar uma última palavra com cada um. Na coxia, vi o coral do Hospital Alemão abraçado, em círculo. Cheguei perto e os abracei. Estavam orando! Fui até o coral do SBT e, de mãos dadas, já tinham orado! A secretária do Sílvio Santos me disse: “Maestro, se não fizéssemos nossa prece, talvez desafinássemos tudo.” Oraram sem minha ordem! Saí emocionado, vendo que eles já tinham aprendido a buscar na Fonte. Já aconteceu de eu esquecer de orar e eles me cobrarem.

O fato de ser filho de pastor teve alguma influência em sua motivação missionária? A religião do lar é importante nesse sentido?

Sim. Meu pai, o pastor Aurélio, foi missionário no antigo Mato Grosso e no interior de São Paulo. Cresci ouvindo lindas histórias de como Deus agiu na vida dele e das igrejas. Vi seu trabalho, seus valores, o culto doméstico; ele era bem firme. Agradeço a Deus pelo lar em que nasci. Minha mãe, professora Therezinha, foi sempre líder também, orientadora, diretora de escolas. Os dois realizaram muitas proezas. Aos 11 anos, fui para o IAP, depois Iasp e IAE-SP (hoje Unasp). Colportei nove férias. Tudo isso me moldou. Cresci falando que seria pastor.

E por que decidiu ir para a música?

Estudei piano desde os 9 anos, mas só no 3º colegial o Senhor me mostrou que era a música. Como Deus me pôs na USP, é uma história maravilhosa! E enquanto eu desfrutava da maior universidade do país, decidi agradecer dedicando-Lhe meu futuro.

Como foi seu tempo de estudante na universidade? Enfrentou algum tipo de luta para manter seus princípios cristãos?

Lá dentro, tive testes com o sábado, ideologias, festas, etc. Nunca tinha estudado numa escola não-adventista. Foi um choque! Escolhi dizer “Não, obrigado” para muitas coisas. Um professor ateu pensava que o ciclo semanal já estava alterado. Estudei a fundo e provei que não. Ele passou a crer no sábado bíblico.

Como você avalia as tendências atuais na música adventista?

No Brasil, nossa música é famosa pela qualidade. Tenho a alegria de fazer parte da geração de músicos que colocou a música adventista no topo da qualidade artística. Agora tenho duas questões: (1) O meio evangélico sobrepujou nossa liderança em quantidade e já empata conosco em qualidade técnica. É só ouvir as rádios. Agora somos tentados a copiar “as outras nações” e usar suas fórmulas de sucesso. Mas nunca nos destacaremos assim. E aí? Para onde ir? Quem fará o contra-ponto? Precisamos buscar a aprovação do Senhor. No que Ele aprova, há o selo do Espírito. Peço isso sempre. (2) A música vocal adventista está sendo invadida com um jeito ardente, sensual. Minha formação e especialização são nas áreas de Composição e Canto. Algumas técnicas vocais são sensuais, sim. Utilizá-las em música romântica, soul, blues, ainda vá lá... Mas, no púlpito?! Amy Grant, depois Patti Cabrera, Jaci Velasquez e agora “pegou” ao redor do mundo. Já são muitos cantando desse jeito. Isso é emoção, mas pensam que é o Espírito! Que a música protestante sempre copiou os estilos do mundo, desde Lutero, isso é um fato; mas Deus nunca nos chamou para copiar as outras igrejas. Nossa mensagem e chamado são diferentes e únicos – nossas apresentações não deveriam ser?

Em sua opinião, que tipo de música é mais adequado para o louvor a Deus?

A música é meio “terra de ninguém”. Todo mundo opina e acha que Deus tem o mesmo gosto seu. Já sofri com críticas cruéis. Por isso não quero julgar ninguém. Sei que todos precisamos nos reavaliar. Minha esposa e eu descobrimos o que nos interessa: não queremos cantar sobre o poder, sem o poder! Muitas vezes, um lindo arranjo esconde a pobreza da música. Mas é mais difícil uma bela voz esconder a falta de poder. Então, podemos cantar um hino e não ter poder algum. E podemos cantar uma composição atual e perceber o poder do Céu, pela comunhão do compositor, intérprete. Essa comunhão ou não de cada músico transparece na hora da sua ministração. A maioria dos adoradores adventistas percebe quando um músico interpreta trazendo glória para o Criador ou para si mesmo. Mas sei que, em breve, nem esse critério será seguro, dada a contrafação de poder que ao inimigo será permitido fazer.

Você também é conhecido como um propagador da reforma de saúde. Que relação vê entre esse assunto e a vida cristã? Como pregar equilibradamente sobre isso?

A Bíblia é nossa regra de fé e prática. Tudo tem que partir dela. Daniel é o único livro selado para os últimos dias. Nossa igreja nasceu com a abertura desse livro. Por que Deus pôs o estilo de vida bem ali, no primeiro capítulo? Ele sabia que precisaríamos dessa primeira lição para abrir nossa mente às aulas seguintes. Seguir a conexão que Daniel faz ali com o Éden, revolucionou nossa alimentação, corpo, mente, tudo! Falamos em três canais de TV, rádio, dos maravilhosos resultados. Daniel foi o primeiro pós-diluviano que apostou na dieta original. O resultado? Dez vezes mais! Será que Gênesis 1:29 seria perfeito para nós também? Não dávamos atenção ao relato da alimentação no Éden por vivermos após o pecado. Mas Daniel deu.
Resolvemos começar um programa prático sobre a Reforma de Saúde com o Chorus Dei, no Iasp. Programas, palestras com profissionais, cursos de culinária, lançamos o site www.dietaoriginal.com.br, com muitas receitas inéditas, fundamentos bíblico-científicos, etc. Muitos ficaram livres de várias doenças. Neste ano, até o Maestro Neschling, da Sinfônica de São Paulo, implantou na orquestra a alimentação natural, exercícios, etc., porque quer cada músico mais saudável também. Contratou o médico naturalista Dr. Alexandre Feldmann. O mundo está enxergando, e se deixarmos de proclamar essa luz que é nossa, o mundo nos ultrapassará. As pedras clamarão.

Meses atrás, você e sua esposa passaram por uma experiência dramática relacionada com seu filho mais novo. O que houve?

Após levantarmos a bandeira da Reforma de Saúde, o inimigo nos atacou. Ele quis destruir nossa família pela parte mais frágil: o Ian Victor. Com apenas seis meses, ele teve, de repente, baixa sérica sanguínea total. Nada conseguia subir o nível das plaquetas, imunologia, etc. Na UTI da Unicamp, por duas vezes ele quase morreu. Encaminharam-nos para o Boldrini (referência internacional em hematologia), quando diagnosticaram Mielodisplasia, doença grave que estraga a produção da medula: as células fabricadas saem deformadas. A cura, só por quimioterapia e transplante de medula óssea, o mais rápido possível. Esperávamos no Senhor, e Ele nos dava promessa de livramento a cada madrugada (era a Palavra dEle em jogo), mas o menino só piorava.

Dias depois, antes de começar a quimioterapia, nos deram “alta” porque em 36 horas o sangue dele tinha subido de 30 mil plaquetas para mais de 280 mil, quase dez vezes mais! Três dias depois, pediram retorno: as plaquetas tinham ido para 614 mil, 20 vezes em apenas cinco dias! O Hb subiu dois pontos em cinco dias! A Dra. Sílvia Brandalise, fundadora do Boldrini, mandou escrever no prontuário dele: “Nós não temos explicação para a recuperação espetacular do Ian Victor.”

Como o apóstolo Paulo, “presos para testemunhar para muitos na capital” da saúde, na nossa região. A história correu. Se tivéssemos levantado, ensinado e vivido uma mentira, jamais teríamos a aprovação do Criador, muito menos de forma milagrosa! Fomos lançados na “fornalha ardente”, mas Jesus caminhou conosco. Saímos ilesos pelo poder de Deus que julga tudo.

terça-feira, outubro 09, 2007

Casal missionário

Ciro Alfredo Pereira Gonçalves nasceu em março de 1971, em Alegrete, RS. Técnico em Enfermagem, trabalhou por dez anos na área de saúde no Brasil (nos hospitais da PUC, do Serviço Militar e da Beneficência Portuguesa). Neusa Arlete Kielbovicz Gonçalves, também é gaúcha, de Porto Alegre, e nasceu em março de 1963. É obreira bíblica e pedagoga, tendo trabalhado 14 anos como professora, orientadora educacional e diretora de escolas adventistas no Brasil.

Nesta entrevista, concedida a Michelson Borges, eles contam por que decidiram deixar o emprego no Brasil e trabalhar como missionários em Guiné-bissau, na África.

Quando e como surgiu a idéia de serem missionários em outro país?

Desde que me tornei adventista [Neusa] com 18 anos, acalentei dentro do meu coração o desejo de ser missionária, mas nunca antes havia tido oportunidade de realizar esse sonho. Minha vida tomou outros rumos e deixei a idéia de lado. Em 2001, o desejo de ser missionária reacendeu e passei três anos tentando incutir na mente do meu marido a importância de ser missionário. Por fim, em 2004, ele estava cansado de seu trabalho como auxiliar de enfermagem. Ele trabalhava dois sábados por mês e não estava contente com isso. Por isso, sentiu-se animado a ser missionário comigo, pois desejava mudar de vida também.

Em fevereiro de 2004, fomos para Guiné-bissau, na África Ocidental.

Por que escolheram Guiné-bissau?

Não escolhemos. Oramos muito para que Deus nos dirigisse. Escrevi para muitos paises, muitas Associações, Uniões, Missões e para a Adra, principalmente. Finalmente, Nigéria e Guine-bissau nos responderam positivamente. Como na Nigéria seria necessário o Inglês, ficamos um pouco aflitos, mas nada nos faria voltar atrás, mesmo que tivéssemos que melhorar nosso Inglês rapidamente.

Decidimos que o primeiro país que nos desse sinal verde seria para lá que iríamos. Guiné-bissau nos confirmou, em dezembro de 2003. E após a confirmação com a União da África Ocidental, dissemos “sim”.

Falem um pouco sobre o país, seus costumes, religião, hábitos, economia, povo, etc.

Guiné-bissau tem 1,5 milhão de habitantes (o último censo foi um 2002). É um país formado por 39% de muçulmanos, 49% animistas e 11% cristãos. Animismo é a religião dos africanos, e tem que ver com feitiçaria.

O clima é tropical úmido; a vegetação está muito comprometida, pois o cultivo de Caju tem tomado todo o espaço do país (Guiné-bissau é o quarto maior país produtor de castanha de caju).

O idioma oficial é o Português, mas o dialeto mais falado (mais até que o Português) se chama Criolo.

O custo de vida é muito alto, por isso a alimentação básica do povo é arroz com molho (que eles chamam de “mafé”). Por vezes, colocam peixe grelhado.

Não há indústrias, nem fabricas. O povo trabalha no comércio, principalmente o comercio informal. O país é considerado instável política e economicamente.

Guiné-bissau teve sua independência de Portugal em 1974, depois de 11 anos de luta. Em 1998, tiveram uma guerra interna que durou 11 meses, durante a qual houve um golpe de Estado. Ainda hoje se vêem prédios destruídos e carros de guerra nas estradas. O povo continua traumatizado com a última guerra.

Como vocês se prepararam para ser missionários? Quais as principais qualificações para se ser missionário em outra cultura?

A preparação maior é o chamado que sentimos no coração de sermos úteis à causa de Deus, seja onde for. Qualificações? Desejar deixar-se ser usado por Deus, independentemente de onde e como for; ter paciência e muito amor para aguardar os resultados visíveis e invisíveis pela fé; não desejar mudar a cultura de ninguém, mas ajudá-los a saber distinguir o que é bom ou não em sua cultura, mostrando o desejo de Deus para nós do jeito que somos.

O que vocês faziam lá?

Fomos com trabalhos definidos. Eu [Ciro] fui diretor de Jovens e Desbravadores. Trabalhei durante dois anos orientando e ajudando nesse departamento. Em 2006, fui convidado a trabalhar na Adra como supervisor. A Adra Guiné-bissau recebe leite enriquecido da Adra Suíça. O leite é distribuído por meio dos Centros de Saúde para crianças desnutridas e mulheres gestantes ou que amamentam.



Eu [Neusa] fui para trabalhar com a Adra como conselheira pedagógica num projeto de assistência aos refugiados em parceria com as Nações Unidas. Em 2005, pedi para sair do projeto da Adra para poder trabalhar com a escola adventista, pois desejava ajudar a escola antes de voltar ao Brasil.

Nossos planos eram de voltar ao Brasil no fim de 2005, mas fomos convidados a continuar por mais tempo, e pediram que eu coordenasse, em 2006, o Projeto Adra-Refugiados (o mesmo projeto do qual fui coordenadora pedagógica). O projeto dá assistência aos refugiados políticos ou de guerras dos paises vizinhos, o que inclui assistência médica, educacional, psicológica, além de ajuda na agricultura com microcréditos. Trabalhei no projeto até voltarmos para o Brasil, neste ano.

Como é a igreja adventista lá? E os adventistas?

A igreja adventista conta com cerca de 1,5 mil membros em todo o país. Temos duas igrejas organizadas e mais de dez grupos. Na capital, temos apenas uma igreja com seis grupos. Há também seis escolas adventistas com cerca de 2,5 mil alunos em situação precária.

Os adventistas lutam contra os hábitos da família sobre as cerimônias. Muitos são pressionados para participar nessas cerimônias. Há jovens que muitas vezes passam dias sem comer, pois a família prepara peixes de couro propositalmente, para ver se os adventistas serão fiéis. Alguns são expulsos de casa por causa da fé.

Que cerimônias são essas?

Alguns exemplos: quando alguém da família ou amigo da família morre, é necessário levar animais para matar a fim de “garantir” a alma do morto. Eles também participam de festas de bebedeiras e comilanças durante o período (às vezes semanas) do funeral. Há também o “fanado”, que é a circuncisão masculina e feminina, que são feitas no mato durante muitos dias, ou até meses, sem a presença da família. Ali os jovens aprendem sobre feitiçarias e rituais que não podem falar para ninguém. Sem higiene, muitos morrem durante o fanado. Outros rituais de certas etnias envolvem comer carnes imundas, como a de cachorro.

Contem duas experiências marcantes que viveram como missionários.

Organizamos um primeiro acampamento com os jovens numa ilha chamada Galinhas. Foi um grupo de jovens muito animado. Para chegar nessa ilha, precisávamos ir de canoa durante duas horas de viagem. Realmente esse país dá muito trabalho para os anjos, pois eles devem se ocupar muito com pessoas que viajam e vivem sem proteção ou segurança alguma. A canoa não era segura. Era feita de madeira e entrava água pelos buracos. Além disso, não havia coletes salva-vidas.

Na ida foi tudo muito bom. E na ilha tivemos dias agradáveis. O problema foi a volta, quando passamos por uma experiência que, segundo o pastor da Igreja Central, ele jamais vivera (isso que ele é um homem experimentado nas águas de Guiné-bissau).

Os marons (ondas) começaram a se agitar e aumentavam cada vez mais. O pavor foi tomando conta de todos que estavam na canoa. Os jovens cantavam cada vez mais alto hinos de louvor a Deus esperando Sua ajuda. Todos começaram a ficar assustados. Os animais (porcos, galinhas, etc.) gritavam. Mesmo o pastor disse que pensava que não sairiam daquela tempestade com vida.

Eu [Ciro] também estava com medo, pois via a cidade ao longe, mas parecia impossível alcançá-la. Por fim, com a experiência do capitão do barco e certamente com a ajuda de Deus, conseguimos chegar ao porto. Todos muito assustados.

Outra história que nos marcou tem que ver com um jovem chamado Afonso. Hoje ele tem 17 anos e foi batizado há quatro anos na Igreja Adventista. Ele era feiticeiro desde os oito anos de idade. Fazia cerimônias para que as mulheres ficassem grávidas. Ele era muito sincero. Acreditava que o Iran (diabo) era bom e por isso pedia as coisas para ele. As mulheres realmente ficavam grávidas e, por isso, Afonso gozava de muito respeito na aldeia, apesar de se locomover arrastando-se pelo chão, devido à paralisia infantil.

Um dia, o pastor Herculano foi fazer evangelismo na ilha das Galinhas e levou um filme sobre a vida e morte de Jesus. Afonso assistiu ao filme. Ficou impressionado por nunca antes ter ouvido falar de Jesus e surpreso em saber que havia alguém que morrera por ele.

Afonso chorou durante todo o filme e a partir dali aprendeu que não devia mais fazer cerimônias para o Iran.

Contra a vontade da família, ele deixou de ser feiticeiro e passou a pregar o amor de Jesus. Hoje ele estuda na 7ª serie, na capital, sustentado pelos irmãos da igreja. É uma benção para a igreja.

Qual a principal lição que aprenderam da vida como missionários?

Primeiro: Deus é amor. Ele ama a todos e tem muita paciência com a ignorância humana. Segundo: Deus cuida de Suas criaturas, estejam onde estiverem, mesmo em meio a total insegurança. Eu [Neusa] costumava dizer a eles que os anjos tinham muito trabalho com os africanos e que muitos anjos deveriam estar ocupados com eles, pois vivem 24 horas pela misericórdia de Deus. Sem recursos e sem meios, Deus é a única solução. Mesmo no chamado Primeiro Mundo, sabemos que Deus é a única solução. Mas, infelizmente, por causa dos recursos que muitos têm, acabam buscando soluções em outras fontes e não em Deus. Lá onde servimos como missionários, as pessoas aprendem a depender única e exclusivamente de Deus.

O que diriam para alguém que pensa ser missionário?

Em todos os lugares podemos ser missionários. Ser missionário é ter a coragem e a vontade de ser instrumento de Deus onde estamos e aproveitar cada oportunidade. Mas é claro que, em se tratando de ser missionários em paises como a África, carentes e muito desafiadores, diríamos que se você tem um sonho com o qual possa louvar a Deus, vá em frente.

Desafios são excelentes para nos ensinar a depender mais do Senhor, aprender muitas coisas, crescer profissional e intelectualmente também.

Esteja disposto a abrir mão de seus caprichos e conforto, não pensando em mudar alguém, mas disposto a sensibilizar as pessoas de outra cultura a desejarem mudanças naquilo que vai contra os princípios divinos.

Finalmente, é preciso muito amor, paciência, tolerância, altruísmo e dar sem esperar retorno. O retorno virá talvez não imediatamente, mas é preciso ter paciência para vê-lo surgir. E é preciso muita humildade diante de Deus e dos homens.

terça-feira, agosto 07, 2007

Deus no campus

Professora universitária enfrenta preconceito ao promover debate sobre o criacionismo

A Dra. Eloísa Tudella nasceu em Sorocaba, SP, em 1956. Desde 1980, trabalha como professora no curso de graduação em Fisioterapia, na Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Também leciona no Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia (mestrado e doutorado), do qual atualmente é vice-coordenadora. Além disso, coordena o Núcleo de Estudos em Neuropediatria e Motricidade e os cursos de especialização em Intervenção em Neuropediatria. Dona de sólida carreira acadêmica, tem dezenas de artigos publicados em periódicos científicos nacionais e internacionais.

Freqüenta a Igreja Adventista Central de São Carlos, com sua filha Júlia, de 14 anos.

Nesta entrevista, concedida a Michelson Borges, Eloísa conta um pouco de sua experiência de conversão, de sua postura cristã num ambiente fortemente secularizado e das conseqüências de uma série de palestras criacionistas que ela organizou na Ufscar.

Durante algum tempo você andou afastada de Deus. O que a fez retornar para Ele?

Quando meus pais se tornaram adventistas, eu já era docente da Ufscar e, portanto, não acompanhei o processo de conversão deles. Quando eu ia a Sorocaba, evitava chegar na hora do culto do pôr-do-sol e detestava quando me convidavam para ir à igreja. Quando fiquei grávida, comecei a ver muitas coisas de forma diferente, mas continuava indo a festas e bares, bebendo e fumando. Fumava uns três maços de cigarros por dia. Apesar disso, minha filha nasceu perfeita e linda, graças a Deus. Quando ela tinha seis anos, comecei a ler O Grande Conflito, de Ellen G. White, que minha mãe me havia dado vários anos antes. Enquanto o lia, minha filha, que gostava muito de histórias, pediu para que eu lhe contasse a história do livro. Ao saber do conflito entre o bem e o mal, ela pediu que eu a levasse à igreja para que ela pudesse estar ao lado de Deus. Depois de vários pedidos, fomos à igreja adventista. Começamos, então, a freqüentar a igreja e eu comecei a receber estudos bíblicos, decidindo-me pelo batismo cinco meses depois.

Como sua conversão foi vista pelos colegas de festas?

Foi uma péssima surpresa, não só para os colegas de “noitadas”. A maioria dos meus amigos passou a me evitar; alguns até faziam gozações sobre meu novo jeito de ser. Foi muito divertido o espanto de uma amiga ao me ver entregando, em um café, folhetos do curso “Deixe de Fumar”, do qual eu era a coordenadora.

Qual tem sido sua postura como profissional adventista num meio tão secularizado como a universidade?

No início, tive receio de não poder realizar minhas atividades acadêmicas. Para manter minha convicção religiosa, deixei de ir a eventos científicos e rejeitei os convites para ministrar cursos e palestras aos sábados. Hoje, por ter mantido minha convicção, sou convidada para essas atividades em dias que não comprometem o sábado. Outro desafio foi quando organizei o primeiro curso de especialização oferecido aos sábados à noite e domingo o dia todo. Muitos não acreditaram que haveria alunos; entretanto, já estamos no sexto curso e ele tem tido excelente avaliação e procura.

Recentemente, você resolveu organizar uma série de três palestras sobre o criacionismo na Ufscar. Como surgiu essa idéia?

Desde a época do meu doutorado, a controvérsia entre o evolucionismo e o criacionismo é alvo de meus questionamentos profissionais. Na época, pude escrever um trabalho comparando a importância dos “reflexos primitivos” na vida do bebê humano e do bebê chimpanzé. Após considerar as duas abordagens, optei pela criacionista e, por essa razão, desde então pude desenvolver técnicas de intervenção precoce em bebês de risco, utilizando-me dos reflexos para fins terapêuticos. Neste semestre, estou oferecendo, para 11 alunos, disciplinas do Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia, nas quais são abordadas as teorias sobre desenvolvimento humano. Propus, então, estudar a biografia e o contexto histórico em que viviam os seus idealizadores. Observamos que muitos dos pesquisadores se basearam em Darwin. Durante os comentários, meus alunos disseram ter algum conhecimento sobre a abordagem evolucionista da origem das espécies, mas nada conheciam sobre a versão criacionista. Como eles se mostraram interessados em conhecer essa abordagem, organizei uma seqüência de palestras sobre o criacionismo a fim de promover abertura intelectual e postura crítica em relação aos estudos que fazíamos. Convidei para a primeira palestra o jornalista Michelson Borges, que abordou o tema “Razões Para Crer”; para a segunda, o professor e biólogo Roberto Azevedo, com o tema “ABC das Origens”; e, finalizando, o professor Dr. Nahor Neves de Souza Júnior, com o tema “Ciência e Religião são Compatíveis?”.

A primeira palestra foi apresentada no auditório do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde. Quantos ouvintes estavam presentes e qual foi a reação deles?

Para minha surpresa, o auditório estava lotado, inclusive com pessoas sentadas no chão. Além dos meus alunos, havia alunos e professores de diferentes departamentos da Ufscar e da USP. O fato é que divulguei as palestras no site da universidade por defender a posição de que elas devem ser abertas, principalmente quando se trata de palestrantes vindos de outras cidades. Enquanto o palestrante discursava, percebia-se, por meio de expressões corporais, a desaprovação por parte de algumas pessoas da plenária. Após a apresentação, abrimos espaço para perguntas; mas, ao invés de perguntas, alguns começaram a identificar-se como ateus e foram bastante agressivos e arrogantes em seus comentários. Apenas no dia seguinte é que fiquei sabendo que a divulgação havia sido equivocadamente tratada como um debate entre as duas teorias.

A repercussão da palestra acabou tomando grandes proporções. O que aconteceu, então?

Alguns e-mails começaram a circular na Ufscar me criticando por ter tomado a iniciativa de organizar palestras abordando o tema criacionista, por eles considerado de cunho místico e religioso e que ao ser comparado ao estudo “científico” da evolução biológica, tornava-se uma agressão à inteligência dos “cientistas”. Essa reação me impressionou muito, pois não poderia imaginar que em pleno século 21 ainda existissem pessoas preconceituosas, radicais e absolutistas, tentando impedir o que há de mais importante em uma universidade: a pluralidade de idéias e a divulgação do conhecimento. Além disso, essas pessoas feriram o meu direito de docente e tudo mais que por anos conquistamos, como a democracia, a liberdade de expressão, o fim da censura, etc. As manifestações não pararam aí. Minha perplexidade aumentou quando a questão foi levada para ser discutida em um conselho, no qual se estabeleceu a norma de que palestras a serem proferidas no auditório do centro devem antes ter o aval da chefia ou do coordenador imediato ao proponente.

Nesse contexto, pude perceber que certas pessoas, que inicialmente pareciam me apoiar, tal qual Pilatos, mudaram de posição para não perder prestígio político. Outra pessoa chegou a afirmar que, se dependesse dela, palestras sobre o criacionismo jamais seriam realizadas na Ufscar. Mas, graças a Deus, é a minoria que pensa assim.

Quais os frutos positivos das palestras?

Primeiramente, consegui atingir meu objetivo de proporcionar informações sobre os temas aos alunos e demais interessados. Acredito que pude cumprir com o meu papel de docente, pois entendo por universidade um espaço em que as informações não devem ser restritas à visão de convicção do professor.

Gostaria de deixar registrado que as palestras foram fantásticas e de excelente qualidade. Também pude me sentir realizada ao ver nos alunos o interesse que as palestras despertaram, principalmente porque elas deram o início para mais questionamentos. De acordo com o relato de alguns, as palestras lhes proporcionaram a oportunidade de repensar suas crenças e de se posicionar mais conscientemente frente à profissão que escolheram. Outros comentaram que as palestras proporcionaram a oportunidade de falar sobre questões que em outro fórum seriam repudiadas.

Por fim, ressalto que muitos solicitaram que mais palestras sobre o criacionismo sejam promovidas pela Ufscar.

Qual a lição que você tira disso tudo?

A primeira é a de que Deus realmente existe. Se Ele não existisse, fosse mais um mito, não teria causado tanta polêmica em uma universidade de referência científica como a Ufscar.

Segunda, tenho a convicção de que aqueles que assistiram às palestras jamais voltarão a ouvir ou a ler textos, científicos ou não, da mesma forma como o faziam. Agora poderão discernir em qual das vertentes os textos/reportagens estão embasados e, dessa forma, avaliar e opinar de forma mais consciente.

Terceira, Deus estará sempre ao nosso lado, dando-nos força para enfrentar as dificuldades quando trabalharmos em prol de Sua causa, mesmo que seja indiretamente.

Que conselho daria aos profissionais adventistas que lutam para manter e expressar suas convicções em ambientes não muito simpáticos a idéias religiosas?

Devemos acreditar que os nossos sonhos são parte dos planos de Deus para nossa vida e Ele nos ajudará a realizá-los. Alguns tentarão nos impedir, obstruindo nossos caminhos para que desistamos de nossos sonhos. Mas temos que focar naquelas pessoas que estão a nosso favor, nos ajudando para que possamos gerar conhecimento. Assim sendo, e com a ajuda de Deus, teremos forças para transpor as barreiras e alcançar os nossos ideais. De acordo com o Salmo 56:8, “contaste os meus passos quando sofri perseguições; recolheste as minhas lágrimas no Teu odre; não estão elas inscritas no Teu livro?”

sexta-feira, julho 27, 2007

Em busca das digitais do Criador

Em sua última edição (Ano 11, edição 118), a revista Eclésia - "A revista evangélica do Brasil" - publicou entrevista de cinco páginas com o jornalista e membro da Sociedade Criacionista Brasileira (www.scb.org.br) Michelson Borges, que fala sobre ciência e religião, design inteligente, idade da Terra, dilúvio, dinossauros, fósseis e muito mais. Confira a íntegra da entrevista aqui:

Vários cientistas costumam criticar o criacionismo e chamá-lo de “pseudo-ciência”, alegando que se trata de uma filosofia religiosa e não uma teoria com bases científicas. O criacionismo é ou não científico?

O criacionismo, no fundo, está mais para filosofia e teologia do que para ciência, uma vez que em sua base jaz a crença no Deus Criador, algo que de fato não pode ser demonstrado em laboratório. Mas muitas das premissas criacionistas podem ser verificadas empiricamente, sim. Como, por exemplo, a impossibilidade da origem da vida a partir de matéria inorgânica, de maneira casual. Por muitos anos, os cientistas evolucionistas vêm tentando criar os componentes básicos da vida em laboratório, mas sem sucesso (mesmo o famoso experimento de Urey-Miller vem sofrendo sérios questionamentos). E ainda que os cientistas conseguissem, contra todas as probabilidades, fazer surgir alguma coisa parecida com uma célula ou quem sabe o DNA, estariam apenas provando que para se criar vida é necessário planejamento inteligente e condições programadas. Note: com toda a tecnologia de que dispõem e depois de tanto tempo e dinheiro gastos em pesquisas, os evolucionistas querem nos fazer crer que algo que eles não conseguem criar teria surgido de maneira espontânea e não planejada. É justo dizer que isso também se trata de filosofia; ou mesmo “teologia”: a “teologia” dos deuses tempo e acaso.

Ciência e religião podem ser conciliadas?

Depende de que ciência e de que religião se está tratando. Se você se refere à religião bíblica e à ciência experimental, a conciliação é perfeitamente possível. Exemplo disso são os chamados “pais da ciência”. Galileu, Copérnico, Kepler, Descartes, Newton e outros grandes gênios científicos do passado eram também homens de profundas convicções religiosas. Para Newton, o principal objetivo da ciência é realizar uma argumentação retrospectiva ao longo da cadeia de causas e efeitos mecânicos até chegar à primeira de todas as causas, que certamente não é mecânica, e que, para Newton, era Deus. Por isso, ele encarava o aprendizado como uma forma de obsessão, uma busca a serviço de Deus.

Segundo Nancy Pearcey e Charles Thaxton, autores de A Alma da Ciência, “o tipo de pensamento conhecido hoje em dia como científico, com sua ênfase na experimentação e formulação matemática surgiu numa cultura específica – a da Europa Ocidental – e em nenhuma outra. ... Os mais diversos estudiosos reconhecem que o Cristianismo forneceu tanto os pressupostos intelectuais quanto a sanção moral para o desenvolvimento da ciência moderna”. Como assim?

Primeiro, a Bíblia ensina que a natureza é real, diferentemente de outros sistemas religiosos que a consideram irreal, como o panteísmo, o hinduísmo e o idealismo. Segundo, a doutrina bíblica da Criação implica que o mundo não é ilusório; antes, é “uma esfera de estruturas definíveis e relações reais e, portanto, um objeto passível tanto do estudo científico quanto filosófico”, nas palavras de Langdon Gilkey, professor de Teologia da University of Chicago School of Divinity. Terceiro, na visão bíblica, a natureza tem valor, pois o que Deus fez é bom. Os gregos antigos, por exemplo, não tinham essa convicção. Eles equiparavam o mundo material ao mal e à desordem, daí o fato de denegrirem qualquer coisa relacionada à esfera material. O trabalho manual era relegado aos escravos, enquanto os filósofos levavam uma vida de ócio, na busca das “coisas elevadas”. Provavelmente esse seja um dos motivos pelos quais os gregos não desenvolveram uma ciência empírica, que requer observação prática e de primeira mão, bem como a experimentação. O cristianismo ensina que o mundo físico tem grande valor como criação de Deus e que as coisas materiais devem ser usadas para a glória de Deus e para o bem da humanidade. Por isso, na Europa Ocidental cristã nunca houve o mesmo desprezo pelo trabalho manual. Não havia uma classe de escravos para realizar trabalhos e os artesãos eram respeitados.

“Enquanto a natureza é objeto de adoração religiosa, sua análise é considerada uma heresia... O monoteísmo da Bíblia [do Deus fora da matéria] exorcizou os deuses da natureza, libertando a humanidade para desfrutá-la e investigá-la sem medo. Somente quando o mundo deixou de ser um objeto de adoração é que pôde tornar-se um objeto de estudo”, dizem os autores de A Alma da Ciência. E para que se tornasse um objeto de estudo, o mundo deveria ser encarado como um lugar onde os acontecimentos ocorrem de modo confiável e regular – o que, diga-se de passagem, também foi um legado do cristianismo bíblico.

Portanto, a ciência experimental e a religião bíblica não apenas são compatíveis, como aquela nasceu com a ajuda desta.

Quais são os principais argumentos para se defender que o mundo foi criado por Deus e não houve uma evolução de milhões de anos?

Se tivesse havido uma evolução de milhões de anos, isso teria de alguma forma sido preservado no registro fóssil. Deveria haver milhares de elos de transição entre os animais fósseis. Mas não é o que se vê. Os fósseis são perfeitamente reconhecidos conforme seus “tipos básicos”. Note que mesmo antes de Darwin surgir no cenário histórico, Newton já percebia essa incoerência: “Se os homens, animais, etc., tivessem sido criados por ajuntamentos fortuitos de átomos, haveria neles muitas partes inúteis, aqui uma protuberância de carne, ali um membro a mais. Alguns animais poderiam ter um olho só, outros, mais dois.” Ainda nem se falava em design inteligente, mas Newton já advogava a idéia.

Outra evidência de que o mundo foi criado e planejado nos vem dos chamados “princípios antrópicos”. Por exemplo, temos 21% de oxigênio na atmosfera, o que torna a vida possível na Terra. Se fossem 25%, haveria incêndios espontâneos. Se fossem 15%, os seres humanos ficariam sufocados. Se a atmosfera fosse menos transparente, não haveria radiação solar suficiente sobre a superfície da Terra. Se fosse mais transparente, seríamos bombardeados com muito mais radiação solar. E o que dizer da interação gravitacional Terra-Lua? A distância entre elas faz com que os efeitos sobre as marés, sobre a atmosfera e sobre o tempo de rotação sejam ideais para manter a vida e a estabilidade no clima. Finalmente, Se a força gravitacional fosse alterada em 0,00000000000000000000000000000000000001 por cento, o nosso Sol não existiria e, portanto, nós também não.

Ninguém jamais aceitaria que os equipamentos de suporte de vida de uma espaçonave pudessem surgir por acaso ou se ajustar ao longo de milhões de anos. O que dizer, então, do fino sistema de suporte de vida da “nave” conhecida como Terra?

Você percebe que a existência da vida é uma inescapável conseqüência da lógica e de planejamento inteligente?

Como o criacionismo explica a medição de tempo e de idades de rochas e fósseis que remontam a origem da vida há milhões de anos no passado?

O arqueólogo Säve Söderbergh referiu-se às atitudes comuns entre seus colegas nos seguintes termos: “Se uma datação radiocarbônica apoia nossas teorias, nós a colocamos no texto; se ela não contradiz frontalmente, colocâmo-la no rodapé e, se for discrepante, simplesmente não a mencionamos.” Bastante tendencioso, não?

O criacionista clássico, fundamentado na Bíblia, admite que a vida na Terra tenha cerca de 6 a 10 mil anos. Assumindo a origem da população humana com Noé, e admitindo um crescimento médio anual da ordem de 0,5% (hoje ele se situa em torno de 2%) para assimilar guerras, epidemias, pragas, baixo nível de conhecimento e outros fatores que fazem baixar o nível de crescimento populacional, 4.300 anos seriam suficientes para ser atingida a atual população da Terra. Um crescimento médio de 0,35% ao ano, desde Noé até Cristo, permitiria que a população mundial atingisse os supostos 300 milhões de habitantes daquele tempo. Por outro lado, se a espécie humana tivesse um milhão de anos de existência, como dizem, mesmo a pequena taxa de crescimento médio de 0,1% ao ano faria surgir um número fantasticamente grande de habitantes, os quais nem todo o Sistema Solar poderia conter!

Também é interessante notar que o comportamento dos elementos radioativos nem sempre promove, em todos os casos, a idéia de uma Terra extremamente antiga, como querem os evolucionistas. Robert Gentry, incontestável perito mundial em halos radioativos, percebeu isso. Os radiohalos (ou halos radioativos) correspondem a microscópicas feições encontradas preferencialmente em biotita, um dos minerais essenciais das rochas graníticas. Essas minúsculas estruturas são originadas pela emissão de partículas alfa, a partir de um pequeno grão de material radioativo. No seu trajeto, essas partículas danificam a porção mineral circunjacente. Tendo em vista o contínuo processo de desintegração radioativa de “pai” para “filho”, partículas alfa com energias ou velocidades diferenciadas são produzidas, gerando então uma estrutura equivalente a várias esferas concêntricas, cujo centro conteria o referido grão radioativo.

Segundo o próprio Gentry, sua maior descoberta foi verificar a presença de radiohalos de Polônio, de origem primária, em granitos pré-cambrianos (0,6 a 4,6 bilhões de anos). Acrescentando-se à descoberta o fato de que os halos radioativos só são preservados a temperaturas inferiores a 300 °C, chegou a seguinte conclusão: os granitos “pré-cambrianos” foram criados a baixa temperatura e de maneira praticamente instantânea, afinal, a meia-vida do Polônio218 é de apenas três minutos! A evidência era tão grande que Gentry tornou-se criacionista.

Gentry descobriu que os granitos tiveram que ser criados de forma rápida e à frio. Para o pesquisador, o granito “pré-cambriano”, ou embasamento cristalino primordial da crosta terrestre, teria sido criado por Deus no primeiro instante (tempo inferior a três minutos) do primeiro dia da criação, há cerca de 6 mil anos. E até agora ninguém contradisse o perito em alguma publicação científica.

Existe uma idéia divulgada entre os criacionistas de que o dilúvio bíblico explicaria a extinção dos dinossauros. Pode explicar melhor essa história?

Os fósseis dos dinossauros estão aí para contar a história. Fósseis só se formam se o animal for soterrado rapidamente sob lama e sedimentos (se o bicho morre e fica exposto, acaba devorado por outros animais ou se decompõe). A pergunta é: De onde veio tanta lama para sepultar tantos animais gigantescos em várias partes do mundo? Muitos desses fósseis, inclusive, indicam que os animais morreram em estado de agonia. As pegadas fósseis também contam uma história interessante. Elas só ficaram registradas porque os dinossauros pisaram na lama e depois essas marcas acabaram cobertas por mais lama e ambas se solidificaram. Recentemente, uma equipe de cientistas europeus descobriu marcas de dinossauros no fundo de um lago na Espanha. Liderado por Ruben Ezquerra, da Fundação do Patrimônio Paleontológico de La Rioja, o estudo foi publicado na edição de junho do jornal científico norte-americano Geology. “Quando você vê pegadas, dá para realmente reconhecer um pé no chão. Mas neste caso nós temos apenas séries de sulcos – longos sulcos de 60 centímetros, por exemplo – que são realmente característicos do corpo do animal sendo sustentado pela água”, afirma Loic Costeur, paleontólogo da universidade francesa de Nantes e co-autor do estudo. Agora visíveis na superfície, essas marcas teriam sido deixadas por um dinossauro nadando e arranhando o fundo do lago com as patas traseiras, talvez um carnívoro de grande porte do grupo do Tiranossauro Rex.

Se alguns filhotes de alguns tipos de dinossauros foram salvos na arca de Noé, não sabemos. O que sabemos é que muitas espécies acabaram extintas não apenas pelo Dilúvio, mas também pelos efeitos posteriores e decorrentes da catástrofe.

Se realmente o dilúvio foi universal, uma catástrofe global, de onde veio tanta água, a ponto de cobrir as mais altas montanhas?

Primeiramente, é bom que se diga que as mais altas montanhas do mundo antediluviano provavelmente não fossem tão altas assim. Cordilheiras como a dos Andes e mesmo o Everest estão em movimento e tudo leva a crer que tinham altitude bem inferior há alguns milhares de anos. Somando as águas subterrâneas (“fontes do abismo”) e as águas em forma de vapor na atmosfera (as “águas” sobre o firmamento, de que fala o Gênesis), seria teoricamente possível cobrir toda a superfície da Terra. Depois, toda essa água acabou acumulada nos grandes mares e lagos.

Talvez a menção da formação das cordilheiras há milhares de anos chame a atenção de alguns. Mas é bom lembrar que essa possibilidade existe. Em meu livro A História da Vida, menciono dois exemplos de transformações topográficas rápidas, entre muitas outras registradas na história geológica. Em 27 de agosto de 1883, o vulcão Perbuatão, na ilha de Cracatoa, explodiu e fez afundar a maior parte da ilha, que tinha anteriormente uma área de 40 km2. Em 1950, na Índia, um terremoto transformou a configuração de cordilheiras inteiras na região do Himalaia. Em questão de horas e até minutos, muita coisa pode ser transformada por catástrofes naturais locais; imagine do que seria capaz um cataclismo mundial como o Dilúvio de Gênesis!

O que costuma ser também muito intrigante são alguns fósseis que os evolucionistas costumam classificar como pertencentes a antepassados do homem e dos animais modernos. Como os criacionistas interpretam esses fósseis?

Esse assunto é sempre cercado de muita controvérsia e de vez em quando vemos o que antes eram certezas sendo desfeitas por novas pesquisas. Recentemente, um dos maiores achados arqueológicos foi posto em dúvida por um grupo de antropólogos israelenses. Em um estudo publicado na edição on-line da revista Proceedings of the National Academy of Sciences, antropólogos da Universidade de Tel Aviv afirmam que Lucy (que depois se descobriu ser Lúcio), o famoso esqueleto de Australopithecus afarensis, de supostos 3,2 milhões de anos, encontrado em 1974 na Etiópia, não é o último ancestral comum entre os humanos modernos e uma família de grandes primatas conhecidos como “hominídeos robustos”. Segundo os pesquisadores, determinadas características morfológicas encontradas em Lucy – e que também são encontradas nos Australopithecus robustus – não existem nos humanos.

Volta e meia a árvore evolutiva humana é alterada por novas descobertas que mostram que a tal “árvore” está mais para um monte de galhos desconectados. A propósito, o famoso elo imaginário entre homens e símios continua perdido...

Quais foram os grandes erros de Darwin na elaboração de sua teoria da evolução?

Segundo a Dra. Márcia Oliveira de Paula, professora do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp) e presidente do Núcleo de Estudos das Origens (NEO), ninguém pode tirar o mérito de Darwin pelo seu trabalho, que inclui a idéia da seleção natural, a qual explica como organismos que possuem características mais vantajosas podem sobreviver em um determinado ambiente, em detrimento de outros organismos que não a possuem, e passar essa característica para os seus descendentes. Porém, o grande problema de Darwin e de outros evolucionistas é que eles se baseiam em pequenas mudanças plausíveis, que são observadas na natureza, ou seja, surgimento de novas espécies a partir de uma espécie ancestral, e extrapolam que mudanças muito maiores, nunca observadas na natureza e nem experimentalmente, seriam possíveis, bastando apenas ter ocorrido em milhões ou bilhões de anos. Por isso há quem diga que Darwin acertou no varejo, mas errou no atacado.

Resumindo, a teoria da evolução não consegue explicar a origem da vida por processos naturais, a partir de matéria não viva; também não consegue explicar a origem da informação genética nem de sistemas irredutivelmente complexos; não consegue explicar o aumento de complexidade que teria acontecido nos organismo durante o processo evolutivo, ou seja, não consegue explicar a origem de novos órgãos, sistemas de órgãos e novos planos corporais. Em relação ao registro fóssil, a teoria da evolução não consegue explicar a Explosão Cambriana; e também não consegue explicar a falta de formas de transição entre os principais grupos de organismos. Por outro lado, a teoria da evolução explica muito bem processos como a microevolução e especiação (processo de formação de novas espécies).

No livro A caixa preta de Darwin, o bioquímico norte-americano Michael Behe defende que os sistemas vivos, em nível molecular, são melhor explicados como fruto de um planejamento inteligente. Esse é um dos argumentos do design inteligente contra o evolucionismo. Qual a sua opinião sobre esse movimento?

A Teoria do Design Inteligente (TDI) tem como objetivo demonstrar as insuficiências epistêmicas do darwinismo, propondo um debate científico a respeito da viabilidade ou não dos postulados evolucionistas. Vejo com bons olhos essa iniciativa, já que a idéia é discutir o assunto em âmbito estritamente científico, coisa que o criacionismo dificilmente consegue, devido ao preconceito. Mas, curiosamente, muitos darwinistas viram as costas à discussão e blindam o darwinismo contra essas críticas, alegando que a TDI se trata de um novo tipo de criacionismo.

Tanto o criacionismo como o design inteligente podem ser vistos como teorias estritamente científicas, que não precisam apelar para a religião para ter fundamento?

A TDI pode ser vista dessa forma, já que não apela para livros religiosos ou divindades. O criacionismo, por outro lado, pode ser considerado uma teoria híbrida científico-religiosa, pois vai além do escopo científico, ao identificar o designer como sendo o Deus Criador. A TDI se vale de apenas uma ferramenta: a ciência. O criacionismo também usa a ciência, mas não dispensa a ferramenta da teologia. É o que Newton fazia. E ele pôde enxergar mais longe por isso.

Costuma-se dizer que os criacionistas não têm credenciais científicas e seriam “especialistas autoproclamados”. Qual a sua opinião sobre isso? Pode citar quem são os cientistas criacionistas mais qualificados na atualidade?

Quando li pela primeira vez essa expressão aplicada aos pesquisadores criacionistas, resolvi mostrar que isso não é verdade. Realizei doze entrevistas com pesquisadores cujas credencias são indiscutíveis e publiquei o material em forma de livro, intitulado Por Que Creio. Onze deles são criacionistas brasileiros que atuam em áreas como física, biologia, arqueologia, matemática, botânica, etc. Apenas um, o Michael Behe, não é criacionista, mas questiona o darwinismo de maneira estritamente científica.

Acusar os criacionistas de “especialistas autoproclamados”, portanto, é apelar para o argumento ad hominem é desviar o foco da discussão. O pessoal do Geoscience Research Institute, nos Estados Unidos, é um bom exemplo de gente que faz pesquisa séria em criacionismo.

Apesar do criacionismo, a Igreja Católica finalmente admitiu que o processo de criação do mundo pode ter durado milhões de anos. Essa postura já era aceita por teólogos liberais. Nos próximos anos quem deverá mudar mais: a igreja ou a ciência convencional?


A Igreja Católica tem um histórico de mudanças doutrinárias e de postura ao longo da História. Não concordo que a teologia deva se adaptar às descobertas da ciência, que são bastante mutáveis. Imagine se a Bíblia fosse concordar com a visão geocêntrica aristotélica esposada pelo catolicismo nos tempos de Galileu... A Palavra de Deus é imutável justamente pelo fato de ter sido inspirada por aquele que sabe todas as coisas e não erra. A ciência é um tipo de busca pela verdade, mas nesse processo de busca acaba enveredando por caminhos tortuosos e freqüentemente precisa retornar ao ponto de partida. Não há nenhum problema nisso. A ciência deve ser assim mesmo. O erro está em elevá-la ao status da teologia, sem se entender seu caráter transitório como ferramenta humana.

Ao tentar hibridizar o evolucionismo com a fé na criação, a Igreja Católica acaba criando uma terceira teoria amorfa mais problemática. Se antes de ter existido o primeiro ser humano já havia morte no mundo, então a morte foi criada por Deus, como algo inerente à Sua criação e não é resultado do pecado humano. Isso é absurdo! Jamais aceitaria um Deus assim. Se a história relatada nos primeiros capítulos de Gênesis é mitológica, por que Jesus teria Se referido a ela de maneira literal? Estaria Ele errado e a Igreja certa? Se essa história é mesmo uma alegoria, então o pecado também é uma ilusão. Então, Jesus morreu por quê?

Não sei quem vai mudar mais, se a ciência ou a igreja. O que sei é que a igreja deveria mesmo é se ater a uma visão bíblica que permita que as Escrituras se interpretem a si mesmas e defender essa visão neste mundo cético e irreverente. A tendência conciliatória evita os debates, mas afasta as pessoas da verdade.

Uma das grandes polêmicas educacionais na atualidade é justamente a introdução do ensino da criação no currículo escolar. Como você vê essa questão? Dá para ensinar a teoria criacionista sem ser proselitista?


Considero curiosa a reação negativa de alguns segmentos à inclusão do criacionismo nas aulas de religião, por exemplo. Não vivem dizendo que criacionismo é apenas religião? Então, por que se opor ao seu ensino nas aulas de educação religiosa? Num contexto cristão, considerando-se que o criacionismo é bíblico, não considero seu ensino como sendo proselitismo.

Recentemente começaram as comemorações dos 200 anos do nascimento de Charles Darwin. Como sempre, a mídia deu grande destaque e alfinetou as religiões que acreditam em Deus como Criador. Como você analisa a cobertura da mídia nessas questões? Há parcialidade e até discriminação?

O que mais me chama a atenção é a ausência de homenagens similares a cientistas que deram maiores contribuições à ciência, como Newton e Einstein, por exemplo. Outra postura reprovável é o sensacionalismo. Recentemente, uma revista popular de divulgação científica estampou na capa o seguinte título: “Darwin, o homem que matou Deus.” É a típica capa feita para vender. Infelizmente, de modo geral, a mídia secular está vendida à visão de mundo naturalista e tudo que se oponha a isso acaba sendo hostilizado ou depreciado.

Falando sobre mídia, é possível perceber uma explosão de reportagens, programas e produções com temática espiritualista. Reencarnação, ioga e vidas passadas, por exemplo, são assuntos sempre constantes nas grandes revistas e nas novelas da televisão. Por que tanta ênfase nesses assuntos?

Para mim, evolucionismo e espiritualismo são duas faces da mesma moeda. O grande conflito entre o bem e o mal neste universo teve início quando uma criatura alimentou o espírito de independência. Quis ser mais do que devia e procurou viver como se Deus não existisse; ou melhor, quis ser Deus. A idéia de evolução sem Deus está entranhada em ambas as filosofias, embora uma seja materialista e a outra não.

Sei que pode parecer coisa de teorias conspiratórias, mas o fato é que, à medida que a volta de Jesus se aproxima, esse ser que queria ser Deus tenta cada vez mais incutir nas pessoas o desejo que ele mesmo inaugurou e acalentou por tantos séculos: a independência de Deus, que acaba distanciando a criatura do Criador.

Por outro lado, os evangélicos quase sempre costumam ser criticados pela imprensa secular. Existe alguma discriminação ou até manipulação?

O preconceito existe, sim. Mas às vezes a culpa é dos próprios evangélicos. A fé irracional manifestada por alguns crentes acaba lançando vitupério sobre todos os evangélicos. O cristão atual deve estar, tanto quanto possível, bem informado e evitar fazer afirmações sobre assuntos que desconhece. É muito comum ouvir crentes dizendo que o homem “veio do macaco”, por exemplo. Nada mais incorreto, mesmo para os darwinistas.

Mas o preconceito existe e não há dúvida. Um mesmo telejornal que critica o criacionismo como se fosse mera crendice veicula reportagem sobre as “pílulas” de Frei Galvão de maneira séria.

Uma das mais duras críticas à mídia é de que ela banaliza a sexualidade, incentivando a promiscuidade. Agora, pega fogo a discussão sobre o controle daquilo que a mídia veicula. Você concorda com esse tipo de controle? Não seria um tipo de censura?

Pode até caracterizar um tipo de censura, mas quando se percebe que as letras relativamente inocentes dos sucessos musicais do passado deram lugar a uma linguagem sexual ousada e de palavrões; quando um escritório de advocacia de Chigago causa polêmica com um novo anúncio em que os corpos seminus de um homem e uma mulher dividem um outdoor e incentivam o divórcio; quando novelas veiculam imagens com forte conteúdo sexual em horários nos quais as crianças estão “coladas” na tela da TV; fico pensando se esse não acaba sendo o mal menor. Algum tipo de controle deve haver, já que os pais não têm conseguido fazer isso em casa.

Você pode citar exemplos de como a mídia tem contribuído para erotizar e aumentar a violência, principalmente no universo infantil?

Há poucos meses, um portal de notícias da internet mostrou crianças pedindo autógrafos a uma modelo, durante a festa de lançamento de uma revista masculina na qual ela aparece nua. E tudo como se fosse a coisa mais natural do mundo. O que podemos esperar desta geração que está crescendo com a idéia de que vender o corpo para ser observado é algo perfeitamente normal? Que tipo de homens e mulheres comporão a sociedade nas próximas décadas? Depois não venham reclamar que as mulheres estão sendo tratadas como objeto, que o romantismo foi embora, e coisas do tipo. Quem planta vento, colhe tempestade.

Como você vê o uso de mensagens e propagandas subliminares em filmes, novelas e até desenhos? Algum caso já o deixou mais indignado?

Uma pesquisa publicada na revista Current Biology sugere que propagandas que usam imagens subliminares provavelmente têm efeito. Esta é a primeira vez que pesquisadores conseguiram provas fisiológicas do impacto dessas imagens. E como as propagandas subliminares funcionam, eu as considero uma violação do direito de escolha do cidadão. Ainda assim, as mensagens subliminares que mais me deixam indignado são as ideológicas e dirigidas às crianças. Se os adultos mal podem se defender dessas mensagens, imagine os pequenos.

Quando se fala em mídia, é impossível esquecer da música. Qual é a sua opinião sobre o mercado musical evangélico e sobre a qualidade daquilo que se toca e canta nas igrejas atualmente?

Esse é outro tema polêmico. Por isso, prefiro antes deixar um ex-roqueiro dizer o que ele pensa. Brian Neumann, cuja história de envolvimento com o rock é contata por Samuele Bacchiocchi, em The Christian and Rock Music, faz o seguinte relato: “Logo reconheci que não havia diferença significativa entre o rock secular e sua versão ‘cristã’, independentemente da letra. Música cristã contemporânea que se conforma com os critérios básicos do rock não pode ser usada legitimamente como música de igreja. A razão é simples: o impacto do rock ocorre pela música e não pela letra.”

Se rastrearmos a origem do rock, chegaremos aos tambores dos cultos vodus, caracterizados por orgias sexuais e sacrifícios. A batida dos tambores favorecia o transe e o contato com os “espíritos”. Quando esse estilo musical é exportado para o ocidente, na década de 1969, “coincidentemente” tem início o movimento da contracultura, com sua negação dos valores morais. Droga, sexo e rock’n’roll são as palavras de ordem. Bem, Raul Seixas mesmo já dizia que o diabo é o pai do rock. A jogada de mestre desse “pai” foi introduzir esse estilo musical nas igrejas. Que efeitos terá isso sobre as congregações? Será que o tipo de reavivamento embalado pelo rock e ritmos derivados dele é bíblico? Como pergunta a Bíblia, que comunhão há entre a luz e as trevas? Taí algo para se pensar.

Hollywood parece cada vez mais sintonizada com a religião. Isso fica claro em produções como Sinais, Ghost, Sexto Sentido e Matrix. Como essas produções influenciam o público?

De fato, Hollywood está interessada em religião, porque o povo está interessado nisso. Mas que tipo de religião? A religião do descompromisso. Mera religiosidade fast-food, na qual eu determino as regras e a forma de adoração, se é que se adora alguém. Além disso, os espíritos estão a solta nos filmes e novelas, doutrinando as pessoas com esse tipo de religião que, como já disse, prega a independência humana.

Há uma enorme polêmica sobre a influência de desenhos animados, filmes, videogames no público, principalmente crianças. Até que ponto a fantasia pode influenciar a realidade?

Muitas pesquisas indicam que essa influência é real e não apenas sobre as crianças. Por isso, devemos estabelecer critérios de seleção baseados nos princípios bíblicos. Somos aquilo que pensamos; é da mente que procedem os bons e os maus desígnios; portanto, temos que levar a sério o assunto da proteção mental (se é que queremos ter a “mente de Cristo”). É importante passar mais tempo em contato com a Bíblia e em oração. Gastamos horas e horas na frente da televisão, lendo revistas ou jogando videogames, mas quanto tempo temos dedicado à nossa comunhão com Deus? Enfraquecidos espiritualmente, vamos sucumbir aos apelos da mídia e seremos cristão infelizes, fracos e formais.

Qualquer tipo de mídia pode virar um tipo de vício. Por isso, é preciso tratar o assunto da perspectiva de um viciado: se não consegue dominar a situação, saia de perto. Mas e se vier a tentação? Aceite o conselho de Gordon Van Rooy: “Quando o demônio bate à porta, peça que Jesus vá abri-la.”

Falando sobre você: como foi sua conversão e como surgiu seu interesse pela ciência, mais especificamente sobre o criacionismo?

Desde criança, sempre gostei de ler sobre ciência, especialmente assuntos relacionados aos dinossauros. Fui aficionado por livros de ficção científica e por séries como Jornada nas Estrelas, o que me levou a apreciar os estudos de astronomia. Antes de conhecer a Bíblia mais a fundo, eu era o que se pode considerar um evolucionista teísta. Cria em Deus, mas aceitava também as idéias darwinistas. Mas confesso que essa forma de pensar não me satisfazia plenamente. Quando me deparei com o criacionismo, por volta dos 17 ou 18 anos, fiquei surpreso e desapontado ao mesmo tempo. Surpreso por descobrir que havia outra maneira de explicar a origem da vida; e desapontado por perceber que não me haviam ensinado isso nem na igreja à qual eu pertencia, nem nas escolas pelas quais passei. Percebi o tipo de doutrinação pela qual as crianças passam desde cedo, ouvindo da tal “sopa primordial” onde teria surgido a primeira forma de vida. Essa “explicação” acompanha a pessoa ao longo de sua vida estudantil, de tal forma que, quando chega à universidade, ela não questiona mais os pressupostos darwinistas. Tremenda lavagem cerebral.

Hoje louvo a Deus por ver as coisas de outro modo e por saber que existe um Criador que me ama e Se interessa por mim. Ele administra as galáxias incontáveis e mantém a estrutura do espaço-tempo; conhece cada estrela pelo seu nome, mas também cuida de cada aspecto de minha vida.

quinta-feira, junho 14, 2007

Criacionismo, mídia e outros temas

Esta entrevista foi concedida à revista Mais Destaque, de São Paulo, em 2006.

Michelson Borges é natural de Criciúma, SC, e hoje reside em Tatuí, SP, onde desempenha as funções de editor de notícias da Revista Adventista, editor da revista Conexão JA e da Lição da Escola Sabatina dos Jovens, na Casa Publicadora Brasileira. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina, foi professor de História em Florianópolis e um dos editores do jornal da Rádio Novo Tempo daquela capital, onde também apresentava um programa de divulgação científica. Como autor, destacam-se seus livros A História da Vida, Por Que Creio e Se Deus Fez, Se Deus Não Fez (sobre criacionismo), A Chegada do Adventismo ao Brasil, Nos Bastidores da Mídia e a “Série Grandes Impérios e Civilizações”, composta por seis volumes. É membro da Sociedade Criacionista Brasileira (www.scb.org.br), mestrando em Teologia pelo Unasp, editor do site www.criacionismo.com.br e do blog www.michelsonborges.com, e tem realizado palestras sobre comunicação e criacionismo por todo o Brasil. É casado com Débora Tatiane Martins Borges, com quem tem duas filhas: Giovanna e Marcella.

Comente como foi a sua formação religiosa e acadêmica.

Fui criado num lar católico e minha mãe, sempre muito religiosa, foi meu modelo nesse aspecto. Aos 16 anos tive meu primeiro contato com a Igreja Adventista do Sétimo Dia, por meio de um colega de escola. Depois de dois anos e meio de muito estudo e lutas, decidi tornar-me adventista (os detalhes dessa história estão no e-book "...E Deus Nos Uniu", disponível em meu blog www.michelsonborges.com). Fui batizado no fim de 1991, em Criciúma, SC. No ano seguinte, mudei-me para Florianópolis, a fim de iniciar a faculdade de jornalismo na UFSC, onde me formei em 1996.

Quais as maiores dificuldades que o jovem Michelson sofreu e como conseguiu vencê-las?

Em meu tempo de universitário, foram a falta de recursos financeiros suficientes para me manter numa cidade distante da dos meus pais e o ambiente secularizado do campus. Em ambos os casos, a vitória dependeu de íntima comunhão com Deus. Entendi desde cedo que não importava o quanto estivesse ocupado com trabalhos e estudos, o tempo para o relacionamento devocional com Deus não poderia ser passado por alto. E Deus fez a parte dEle: me deu forças para testemunhar e manter os princípios num ambiente difícil e proveu-me de recursos suficientes para sobreviver e me formar.

Como é o marido e pai Michelson?

Faço de tudo ao meu alcance para dedicar tempo de qualidade à minha família. Amo muito "minhas mulheres" (são três em casa: minha esposa Débora e minhas filhas Giovanna, de quatro anos, e Marcella, de um). Entendo que, depois de Deus, elas são o que de mais precioso tenho na vida. Chegar em casa após um dia estafante de trabalho é como entrar num oásis de paz e alegria. Receber o abraço de minha esposa e poder brincar com minhas filhas são coisas que não têm preço. Ah, e não posso esquecer de mencionar nossa companheira e amiga que já está conosco há oito anos: nossa cadelinha Laila.

Como você se descobriu jornalista? E qual conselho daria a alguém disposto a optar por uma profissão?

Foi quando me tornei editor de um jornalzinho da escola técnica onde fiz o ensino médio. Confesso que produzir os textos, ilustrá-los e fazer reportagens me dava até mais prazer do que estudar no curso de química. Foi assim que descobri que preferia o jornalismo à carreira científica e até mesmo artística (já que meu hobby preferido é desenhar).

O conselho que posso dar a quem almeja o jornalismo é que leia muito e escreva sempre. Conhecimento geral nunca é demais. Pensamento crítico e analítico também ajuda, por isso é importante consumir os produtos da mídia com "filtros" adequados.

Sabemos que você é perseverante. Conte-nos, resumidamente, como obteve o posto que ocupa atualmente na Casa Publicadora Brasileira.

Sempre acreditei que meu chamado para ser editor na Casa Publicadora Brasileira foi um milagre e um presente de Deus. Primeiro, porque era muito jovem quando fui chamado, era ainda recém-convertido e não tinha o curso de Teologia. Segundo, pelo fato de não conhecer ninguém aqui em São Paulo ou mesmo na obra adventista. Quando cursava Jornalismo, sonhava em trabalhar na CPB, mas achava que era um sonho praticamente impossível.

O que fiz foi enviar meu currículo por duas vezes, escrever muitos artigos e orar. Apenas dois dos meus textos foram publicados antes de eu ser chamado (um ainda quando era estudante), mas isso tornou meu trabalho conhecido. O resto ficou por conta de Deus.

Você é conhecido por estudar e escrever sobre Criacionismo. O que o conduz a esse tema?

Minha motivação para escrever sobre o criacionismo se deve ao fato de eu ter sido evolucionista até os 18 anos. Fiquei feliz e desapontado, ao mesmo tempo, ao descobrir, há cerca de 15 anos, que havia outra versão para a história da vida. Aprofundei-me nos estudos sobre a controvérsia entre o criacionismo e o evolucionismo a fim de tomar minha própria decisão, e pude perceber que o criacionismo, diferentemente do que a grande imprensa tenta fazer crer, é mais coerente com os fatos observados e com a ciência experimental. Todo esse esforço e essa busca pessoal resultaram em três livros sobre o assunto (A História da Vida, Por Que Creio e Se Deus Fez, Se Deus Não Fez) e um CD-ROM intitulado "História da Vida" (todos lançados pela CPB), além da criação de um site (www.criacionismo.com.br).

Você também escreve (criticamente) sobre a mídia e assuntos veiculados nela. Comente quais foram os seus objetivos ao lançar o livro Nos Bastidores da Mídia e seu (excelente) blog.

Entendo que a mídia secular, de modo geral, está desempenhando papel preponderante no sentido de moldar a mentalidade das pessoas, preparando-as (ou melhor, despreparando-as) para as cenas finais do que se pode chamar o grande conflito entre o bem e o mal. A ênfase exagerada em temas como evolucionismo, espiritualismo, materialismo e sensualismo (distorcido) tende a afastar as pessoas da verdadeira adoração ao Criador, nos moldes de Apocalipse 14. O livro e o blog consistem, antes de tudo, em denúncias contra essa avalanche midiática cujo objetivo (consciente ou não por parte dos que estão nos bastidores da mídia) é anestesiar a mente da que pode ser a última geração a viver na Terra, antes da volta de Jesus.

A CPB está lançando a revista Conexão JA. Como essa publicação pode chegar às mãos de todos os jovens adventistas do Brasil? Há planos para que isso aconteça?

A Conexão JA vem cobrir uma lacuna editorial que tínhamos havia alguns anos. As crianças e os adultos de nossa igreja estão bem supridos de material, com as revistas Nosso Amiguinho Júnior, Nosso Amiguinho, Vida e Saúde, Revista Adventista e outras. Mas os jovens não tinham uma revista que refletisse seus anseios e modo de ser e pensar. Assim, a Divisão Sul-Americana, em parceria com a CPB, decidiu lançar uma publicação cujo publico alvo fosse o jovem adventista (na faixa etária compreendida entre 18-25 anos), o que não quer dizer que outros jovens, que não sejam da igreja, não irão apreciá-la. A idéia é conectar o jovem com Deus, com outros jovens e com as coisas boas da vida. O número especial de estréia já foi impresso e está circulando pelas igrejas e já é possível assinar a revista que, inicialmente, será trimestral. Veja informações no site www.conexaoja.com

Qual a sua opinião sobre Ministérios Independentes, como a revista Mais Destaque, feita para a juventude adventista e que possui - em suas 12 edições - diversos textos de sua autoria?

Se o objetivo se alinha com o da Igreja Adventista, ou seja, motivar o ser humano a um encontro com Deus, destacando assuntos edificantes como saúde, família e religião, sou plenamente favorável. É preciso unir esforços nessa arrancada evangelística final, no espírito da oração de Jesus em João 17.

Para terminar, gostaríamos de saber as suas expectativas para os próximos dez anos de História. Que conselho você dá a cada jovem, adventista ou não, que termina de ler esta entrevista muito especial?

Sinceramente, não gostaria de ter expectativas terrenas para os próximos dez anos. Gostaria muito é de criar minhas filhas na Nova Jerusalém, finalmente a salvo das coisas horríveis que estão acontecendo neste planeta e que tendem a piorar. Espero já estar com Jesus, a bordo da santa cidade, naquela viagem maravilhosa de mil anos pelo Universo, antes de habitarmos a nova Terra para sempre. Mas se isso não acontecer dentro dos próximos dez anos, peço forças a Deus para prosseguir crendo e anunciando a vinda de Jesus, ajudando outros a se encontrarem com o Mestre.

Aos jovens, quero apenas dizer que essa é uma fase muito bonita para decidir andar com Cristo de forma incondicional (como fiz lá nos meus 18 anos). O caminho que Deus nos oferece nos poupa de muitos aborrecimentos e tristezas que não precisam nos acompanhar pelo resto da vida. Deus quer contar com sua força e entusiasmo, mas acima de tudo, quer o seu coração.

terça-feira, maio 29, 2007

Comprometido com Cristo

Juiz fala de sua conversão e de como utiliza sua influência para falar do evangelho

Vanderley de Oliveira Silva, 40 anos, é juiz de Direito do Juizado Especial de Belém, PA. Casado com Wanderly de Oliveira Alencar, tem dois filhos, Mayara, de 9 anos, e Matheus, de um ano. Depois de convertido, ele estabeleceu o firme propósito de usar sua influência para evangelizar e levar a mensagem de salvação aos detentos, ajudando-os a ser reintegrados ao convívio social.

O Dr. Vanderley começou atuando no município de Chaves, na Ilha de Marajó. Depois foi transferido para Itaituba, no extremo sul do Pará. Em seguida, foi para Itupiranga, de onde foi chamado para Viseu, a 350 km de Belém, permanecendo lá por 9 anos. Agora ele reside e atua na capital do Pará, onde foi promovido recentemente para juiz de terceira entrância, cargo final na magistratura.

Nesta entrevista, concedida a Michelson Borges, em Belém, o Dr. Vanderley partilha um pouco de sua experiência e suas lutas.

Na juventude o senhor acabou se afastando de Deus. O que o trouxe de volta?

Tive o privilégio de ter tido uma educação cristã muito saudável, embora vivendo numa situação de pobreza e humildade. Mas com o tempo acabei me afastando de Deus. Quando nasceu minha primeira filha, fiquei preocupado com a formação dela, já que eu estava fora da Igreja. Que futuro e base moral eu poderia dar a ela? Tive então que me afastar dos amigos com os quais bebia e ia a festas. Alguns debocharam da minha decisão, dizendo ser ilógica para um jovem juiz que deveria “aproveitar a vida”.
Graças a Deus, hoje os colegas me chamam mais de “pastor” do que de juiz, e os deboches cessaram. Muitos me procuram para pedir orientação e até mesmo literatura cristã. Isso porque minha postura no trabalho é a mesma que tenho na igreja: sou um missionário.

Que conselho o senhor dá ao profissional que quer testemunhar em seu ambiente de trabalho e conquistar credibilidade?

Tudo se resume nas palavras compromisso e perseverança. Num primeiro momento, os “torpedos” vêm de todos os lados. Passei por situações não somente de escárnio, mas até mesmo de ameaça de morte. Implantamos igrejas em algumas comunidades, com a ajuda de presos que já haviam sido batizados. Isso contrariou outras religiões, já que o juiz da Comarca era agora um “pastor” que estava evangelizando, usando inclusive o fórum como “palco” de evangelismo. Eu tinha menos de um ano de batizado quando fiz esse evangelismo em Vizeu. O principal jornal da cidade denunciou meu trabalho, alegando que eu estava utilizando os detentos para construir igrejas para mim, com objetivo mercenário. Isso foi parar no Tribunal e gerou processos e representação na Procuradoria da República.

Satanás utilizou vários instrumentos para me fazer desistir. Certa ocasião, uma multidão chegou a cercar o fórum; quebraram vidros e gritaram que eu devia morrer. Era ano eleitoral no município e alguns conseguiram dar conotação política à situação. Chamaram-me de “juiz corrupto”, “pastor ladrão”. Meu nome foi ridicularizado na TV e nos jornais. Movi alguns processos criminais e de indenização por danos morais, mas não chegaram a lugar algum. Prescreveram pelo tempo que se passou. Contratei três advogados, mas entendi que Deus tinha uma vitória muito maior para mim. Uma das pessoas que me atacaram, uma advogada, anos depois se retratou publicamente e durante um seminário de que participávamos, entregou-me uma carta escrita a mão, pedindo-me perdão, dizendo que a carga que carregava era muito grande. Eu disse a ela que já a havia perdoado antes de ela me pedir. Os olhos dela se encheram de lágrimas.

As vitórias que o Senhor me concedeu foram concretizadas com centenas de pessoas tomando a decisão pelo evangelho. Dois municípios puderam ser alcançados e muitas autoridades do Executivo e do Legislativo tiveram oportunidade de conhecer a mensagem cristã de forma direta e clara.

Minha promoção teve que ver com esse meu comprometimento social e com a justiça. O presidente do Tribunal disse que eu era um “referencial de exemplo na magistratura paraense” e que “a magistratura se sente honrada pela minha presença entre eles”. Quando fui transferido para a capital, houve uma comoção diferente em Viseu. As pessoas não queriam mais que eu saísse. Deus foi honrado e tenho profunda gratidão a Ele. E essa gratidão se expressa num compromisso cada vez maior com a obra de Deus.

Como o senhor aplica os princípios do evangelho em sua profissão?

Por exemplo, como falar de sugurança pública – grande problema atual – sem falar da segurança maior que encontramos em Jesus? Certa vez, apresentei palestra para um grupo de 300 delegados de polícia e falei sobre a conexão entre o Poder Judiciário e a Polícia. Disse que Deus é a única pessoa que encarna estas duas figuras: a figura do delegado, como agente de investigação do fato, do crime; e a figura do juiz, enquanto consumador da justiça. Nessas duas visões, Deus nos transmite algo sublime, extraordinário, que delegados e juízes precisam compreender: a visão de que a investigação e a aplicação da justiça têm como finalidade principal a redenção, a restauração do indivíduo. Para Deus não existe o que na linguagem policial é conhecido como “pirão perdido”. Para o Criador, nenhum caso é perdido. Se juízes, promotores e policiais encararem as coisas dessa maneira, essa visão vai impregnar de tal forma os discursos, a abordagem nas audiências ou nas investigações, até mesmo no momento de lavrar a sentença, que isso vai fazer toda a diferença no trato com as graves questões sociais que vivenciamos.

Além de manter minha postura cristã aberta, tenho tido oportunidade de distribuir Bíblias e livros como o Vida de Jesus para muitos magistrados. Deixo claro para eles que o Código Penal é importante, mas que acredito que a Bíblia deveria ser o livro de cabeceira de todo juiz. Graças a Deus, tem havido muitas conversões devido a essa minha postura de comprometimento.

Voltando à questão da sua conversão, compare sua vida antes e depois de retornar para Jesus.

Embora tivesse consquistado posição social, estabilidade financeira, uma boa família, a casa dos meus sonhos e privilégios e vantagens da profissão, nada disso me satisfazia, já que o problema estava dentro de mim. Eu sentia angústia, sofrimento de alma, e o que havia conquistado não trazia sentido à minha vida. Houve sufocamento do meu ser, miséria em meu lar e estrangulamento da vida conjugal. Quando me converti e voltei para a igreja, meu casamento melhorou significativamente. O comprometimento com Cristo afeta todas as áreas da vida, inclusive a profissional. Deus me levou a galgar novos horizontes e me sinto um profissional plenamente realizado agora. Posso ajudar as partes conflituosas num processo levando o enfoque espiritual e tenho conseguido inúmeras reconciliações e acordos, pois toco na “ferida”, mostrando a origem dos problemas, fazendo a pessoa repensar sua existência. No caso de separação e divórcio, tem sido possível conseguir algumas reconciliações com esse enfoque. Uso as audiências para mostrar que o evangelho é a solução definitiva para os problemas humanos.

No que diz respeito à minha vida financeira, assumi um pacto com Deus de fidelidade nos dízimos e ofertas. É impressionante que o dinheiro que eu utilizava integralmente para as minhas necessidades pessoais absolutamente não daria para o que faço hoje.

Certa vez, um promotor amigo meu esteve em minha casa e perguntou qual era a fonte da minha prosperidade (ele pensava em uma fonte clandestina desonesta). Disse para ele que a fonte era Deus e contei meu testemunho. Ele ficou ainda mais impressionado quando lhe disse que faço a declaração de Imposto de Renda corretamente, sem usar de subterfúgios para receber maior restituição. E completei dizendo que aparentemente a desonestidade pode nos trazer vantagens, mas no fim das contas é uma maldição terrível que coloca abaixo os principais valores da vida.


Fale sobre seu trabalho de evangelização de detentos.

Tudo teve início a partir da vontade de fazer algo verdadeiramente eficaz quanto ao resgate da cidadania dos marginalizados. Sobretudo, diante da falência do sistema penitenciário, que não consegue reeducar e muito menos ressocializar homens e mulheres encarcerados. Inicialmente, promovemos uma classe de estudos bíblicos na Delegacia de Polícia de Viseu, envolvendo jovens desbravadores. Na ocasião, mais de vinte detentos foram evangelizados e muitos deles foram batizados.

Ao longo de seis anos de trabalho missionário, somente naquela cadeia pública, mais de 50 presos tomaram a decisão de seguir a Jesus e foram batizados. Os primeiros detentos convertidos empenharam-se voluntariamente na construção do primeiro templo da Igreja Adventista na cidade de Viseu. Ao cabo de quatro meses de intenso trabalho, concluímos a construção da igreja com capacidade para 300 pessoas. A influência desse trabalho tem motivado outros irmãos a se empenharem na evangelização de presidiários em outras penitenciárias, presídios, cadeias e centros de recuperação.

Conte duas histórias marcantes desse trabalho.

A primeira se refere a G. F. S., que se envolveu em um crime hediondo, tendo assassinado o próprio cunhado com mais de trinta golpes de facão. Quando estava preso, ele conheceu o evangelho e ali na cadeia foi batizado, tendo tomado a decisão de que quando fosse libertado se dedicaria a levar pessoas a Jesus. Em seu julgamento no Tribunal do Júri da Comarca, a igreja permaneceu 18 horas (tempo que durou a sessão) em oração intercessória. Um milagre aconteceu: os jurados consideraram G. F. S. culpado apenas por crime de homicídio culposo (não intencional), e por força dessa decisão ele recebeu pena de três anos de prisão. Pouco tempo depois, foi beneficiado com livramento condicional, tendo reconquistado a família através do evangelho, levando todos a Jesus. Atualmente, ele exerce atividades missionárias na igreja e trabalha na comunidade em que vive, procurando resgatar outras pessoas escravizadas pelo pecado.

A segunda história é a do jovem A. S. P., praticante de bruxaria, magia negra e macumba, que tinha um terreiro onde se empenhava no “tratamento” de pessoas enfermas, por meio de rituais satânicos. Ele foi preso em razão de ter se envolvido em crime contra o respeito aos mortos, já que mandou desenterrar um bebê recém-nascido do cemitério público da cidade de Viseu e, em seguida, o colocou em um buraco aberto no centro do terreiro onde já havia cobra e urubu envoltos em sangue de boi e mel, pois pretendia obter mais “poder” em suas atividades espirituais.

Na prisão, o jovem, que também mantinha relações homossexuais no terreiro, era rejeitado por todos, inclusive por algumas pessoas que se diziam evangélicas e que visitavam freqüentemente a delegacia, as quais se referiam a ele como sendo um “verme humano; alguém tão vil que nem mesmo Deus poderia perdoar”. Quando A. S. P. conheceu Jesus graças ao trabalho missionário desenvolvido pelos jovens da Igreja Adventista, ele se convenceu de que Deus o amava e ainda havia solução para o seu caso. Tomou a decisão, foi batizado e quando recebeu liberdade, constituiu família. Hoje ele vive para testemunhar do grande amor de Deus manifestado na transformação de sua vida.


Como deve ser feito esse trabalho com encarcerados e que cuidados se deve tomar?


Deve ser feito com muito zelo e seriedade, consciente de que aquelas pessoas são, sobretudo, vítimas da saga assassina do diabo contra os seres humanos. Como primeiro passo, procure cadastrar na Superintendência do Sistema Penal uma equipe de, no máximo, cinco pessoas comprometidas com o evangelho, para cada presídio ou penitenciária, cuidando para que as mulheres tenham contato tão somente com as presidiárias, exatamente para evitar assédios que são freqüentes nesse tipo de ambiente poluído por toda sorte de promiscuidade. Sejam assíduos nas reuniões. É preciso adotar alguns cuidados, tais como: 1) procure não se envolver sentimentalmente com o detento; 2) se você não for advogado, não se envolva com a questão processual do preso; 3) seja criterioso com relação a servir como “pombo-correio”. E tenha plena certeza de que ao se dispor a trabalhar nessa grandiosa missão, o Espírito Santo o capacitará e lhe concederá grandes vitórias em sua vida pessoal, em sua família e também na experiência da libertação espiritual de homens e mulheres escravizados pelo pecado e pelo crime.

sexta-feira, abril 20, 2007

A contribuição adventista

Ozeas Caldas Moura nasceu em agosto de 1955, na cidade de Rubiataba, GO. Doutor em Teologia Bíblica pela PUC, Rio de Janeiro, com Licenciatura Plena em Letras e pós-graduação em Língua Portuguesa. Foi pastor de igreja por 12 anos (Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo) e professor universitário por 13 anos, em São Paulo e na Bahia. Atualmente, é editor na Casa Publicadora Brasileira.

Nesta entrevista, concedida a Michelson Borges, ele fala das contribuições que o adventismo deu à cristandade.

O adventismo surgiu em meados do século 19 e deve muito de suas doutrinas a igrejas protestantes históricas. Poderia mencionar algumas dessas igrejas e quais as contribuições delas para o adventismo?

Recebemos a doutrina do sábado dos batistas do sétimo dia (através de um membro dessa igreja, a Sra. Rachel Oakes Preston, que a passou a Frederico Wheeler - que se tornou o primeiro pastor adventista do sétimo dia). Para mencionar dois exemplos, dos batistas, recebemos a doutrina do batismo por imersão; dos metodistas, recebemos a prática do estudo sistemático e diário da Bíblia e também boa parte dos hinos que hoje cantamos (só para lembrar: Ellen White era metodista antes de se unir aos mileritas e, finalmente, abraçar o adventismo).

O que o adventismo trouxe de “novo”, em termos de doutrina?

De "novo", podemos mencionar a doutrina do Santuário, que explica o que Jesus está fazendo agora (sendo nosso Advogado e Sumo-sacerdote). As outras confissões religiosas não têm isso muito claro, por não entenderem como o santuário israelita era símbolo da obra de Cristo em favor da humanidade. A doutrina do Santuário leva à outra doutrina peculiar aos adventistas: o Juízo Investigativo, ou seja, a etapa do Juízo na qual os pecados são, não somente perdoados, mas também apagados - como acontecia no Dia da Expiação judaico. A doutrina de que o corpo é o templo do Espírito Santo e que deve ser bem cuidado, com um estilo de vida saudável e vegetariano, não é totalmente uma "novidade" adventista, mas foi por esta igreja livrado de exageros (através das orientações de Deus à Ellen White).

No século 19, havia muitos "reformadores da saúde", mas ensinavam exageros. Por exemplo: não usar nada de sal ou de açúcar, não usar nenhum remédio alopático, uso de sangria para "retirar o excesso de vitalidade", vegetarianismo sem nada de produto animal, etc. Através das orientações de Deus à Sra. White, esses excessos e distorções foram apontados como prejudiciais e ficaram fora do vegetarianismo e estilo de vida como o adotado pelos adventistas. Hoje a Ciência Médica está confirmando o que Ellen White falou há um século e meio.

Quanto à mortalidade da alma, pode-se dizer que a compreensão dessa verdade foi graças aos estudos dos pioneiros de nossa igreja, mas essa doutrina também é compartilhada pelas testemunhas de Jeová (grupo que também vem do movimento de reavivamento de Guilherme Miller, como os adventistas).

Qual a base bíblica para a crença de que os mortos estão dormindo, aguardando a volta de Jesus? Que tipo de esperança essa doutrina traz?

Há muitos textos que falam que os mortos "dormem", ou seja, que estão inconscientes e realmente "voltam ao pó". Eis alguns textos: Eclesiastes 9:5, 6 e 10; João 5:28 e 29; 11:11-14 e 25; 1 Coríntios 15:51-55; 1 Tessalonicenses 4:13-18, etc. Essa doutrina nos conforta em saber que mesmo nossos entes queridos que não aceitaram a Cristo não estão sofrendo agora num inferno de fogo. Todos (maus e bons) dormem o sono da morte, aguardando do dia da ressurreição, quando, então, serão julgados e recompensados "segundo suas obras". Também a idéia de que nossos mortos estão dormindo é confortante, no sentido de que eles não estão comtemplando nossas lutas neste mundo. Do contrário, ficariam bastante tristes com todos os infortúnios que acometem seus familiares que ficaram neste mundo.

O sábado pode ser defendido em ambos os Testamentos? Que benefícios traz a sua observância?

Sim, ambos os Testamentos falam do repouso no sábado. Eis alguns textos do Antigo Testamento: Gênesis 2:2-3; Êxodo 20:8-11; Isaías 56:2,4-6; 58:13 e 14. No Novo Testamento: Mateus 24:20; Lucas 4:16; 23:54 e 56; Atos 13:14, 42 e 44; 16:13; 17:2; 18:4; Hebreus 4:4 e 9, etc.

Qual a contribuição adventista para um novo e saudável estilo de vida?

Alguns já foram mencionados na resposta à segunda pergunta. Mas de forma resumida, poderia mencionar: a dieta ovo-lacto-vegetariana, a guarda do sábado como dia anti-estresse, a ênfase nos "Oito remédios de Deus": ar puro, luz solar, uso de bastante água, exercício, repouso, temperança, regime saudável e confiança no poder de Deus. Além da posição de não se usar álcool, fumo ou outra droga qualquer, o não uso de alimentos gordurosos e das carnes chamadas de "imundas" na Bíblia, impróprias para a alimentação, como a carne de porco, de peixes sem escamas, e os chamados "frutos do mar", por exemplo.

Conclusão.

Gostaria de dizer que não somos melhores nem piores em releção às outras igrejas. Somos, sim, mais responsáveis e devedores ao mundo pela quantidade de luz que Deus nos deu, que deve ser repartida com todos os sinceros filhos de Deus que buscam fazer Sua vontade.

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Valdenses modernos

Os adventistas do tempo da União Soviética deixaram grande exemplo de lealdade a Deus

O Pastor Wilmar Hirle nasceu em 1956 e é diretor associado de Publicações da Associação Geral da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Casado com Cleni Bruck da Silva Hirle, tem dois filhos: Walani, de 23 anos, e Gustavo, 19. Formado em Teologia em 1979, pelo IAE (hoje Unasp campus São Paulo), foi diretor de Publicações em várias regiões do Brasil e diretor do mesmo departamento na Divisão Sul-Americana (quatro anos e meio) e na Divisão Euro-Asiática (de 1999 a 2005).

Os valdenses foram seguidores de Pedro Valdo, morto em 1217. Desde o início, esse grupo de cristãos afirmava o direito de cada fiel ter a Palavra de Deus em sua própria língua. Muitos deram a vida para divulgar de forma secreta os ensinamentos das Escrituras. Mas os valdenses não foram os únicos porta-vozes da verdade. Mesmo em tempos mais recentes, houve pessoas que pagaram com a própria vida sua fidelidade a Deus e à Bíblia. Os adventistas do tempo da União Soviética são um exemplo.

Para traduzir, imprimir e espalhar livros dentro da chamada Cortina de Ferro, eram realizadas ações estratégicas dignas dos melhores livros e filmes de espionagem.

Em visita ao Brasil, o Pastor Wilmar Hirle, então recém-nomeado diretor associado de Publicações da Associação Geral, contou a Michelson Borges essas e outras histórias que conheceu e viveu no tempo em que foi diretor de Publicações da Divisão Euro-Asiática.

Descreva, em linhas gerais, a Divisão Euro-Asiática e a obra adventista naquela região.

A Divisão Euro-Asiática possui 300 milhões de habitantes e quase 150 mil adventistas. É composta por 12 países, sendo a Rússia o maior deles. A Ucrânia tem 48 milhões de habitantes e o maior número de adventistas na Divisão: 60 mil. Na Moldávia, país latino, temos uma igreja forte e conservadora, com muitos jovens, parecida com a do Brasil. Ela é considerada uma “incubadora de pastores”, já que sai de lá grande parte dos ministros que atuam na Divisão. Seis desses 12 países são muçulmanos e neles é mais difícil pregar o evangelho. Mesmo assim, a Igreja Adventista cresce ali também.

Nos primeiros dias após a queda do Comunismo, foram batizadas muitas pessoas. Mas hoje já não é essa a realidade. Mais de 40 por cento da população russa é atéia, 40 por cento pertencem à Igreja Ortodoxa e 20 por cento são uma mistura de outros credos, a maioria dos quais muçulmanos (só em Moscou, há 8 milhões de muçulmanos. Somando os muçulmanos da Divisão, há quase 100 milhões deles).

Quais são os maiores desafios evangelísticos da região?

A Igreja Ortodoxa é muito conservadora e prega que religião de russo é somente a Ortodoxa. O materialismo é outro problema. Há uma nova geração que está enriquecendo e não tem tempo para Deus. E os muçulmanos são o terceiro grande desafio. Naquela região está o país mais fechado do Comunismo, o Turcomenistão. Há seis anos, nossa igreja foi destruída lá e fomos proibidos de pregar e produzir livros. Então, começamos a mandar literatura pelo correio, em caixas, para o endereço de um adventista que se encarregava da distribuição. Mandamos milhares de livros. Infelizmente, depois de algum tempo, a polícia descobriu tudo e milhares de livros desapareceram. Mas ficamos felizes porque essa literatura deve ter ido parar nas mãos de alguém.

Atualmente, graças a Deus, a Igreja Adventista atua oficialmente nos 12 países da Divisão. Mesmo no Turcomenistão já temos autorização para trabalhar. O primeiro livro impresso naquele país, após a abertura, foi o Caminho a Cristo, de Ellen White.

Como a obra de Publicações enfrenta esses desafios?

O russo tem literatura “no sangue”. Todo russo sabe como escrever e publicar livros. Eles lêem no metrô, no ônibus, na escada rolante, e isso favorece nosso trabalho com publicações. Temos duas editoras oficiais na Divisão: uma na Rússia, que funciona há 13 anos, e outra na Ucrânia, que está crescendo muito. Além disso, temos um corpo editorial estabelecido em todos os outros países, produzindo literatura e terceirizando a impressão. Temos 3 mil colportores e publicações voltadas só para muçulmanos. Interessante: um dos livros mais aceitos pelos muçulmanos é o Patriarcas e Profetas, de Ellen White, que vende muito.

A barreira da língua também foi superada. Além do russo, cada país tem sua própria língua, e dentro da Rússia há várias repúblicas com seus idiomas locais.

Um fato interessante ocorreu numa república da Sibéria. O irmão do presidente é tradutor e decidiu traduzir a Bíblia para a língua da república. Um pastor adventista o visitou e perguntou se ele não poderia traduzir o livro Caminho a Cristo, e ele traduziu. Ano que vem será o aniversário de 250 anos dessa república e eles nos pediram para preparar uma edição especial do Caminho a Cristo para essa comemoração.

Fale um pouco sobre seu contato com os muçulmanos.

Certa noite, eu estava pregando na capital do Daguistão e, após o culto, uma moça que havia vindo pela primeira vez à igreja me disse: “Vá visitar minha casa.” Quando cheguei lá, vi que ela e a mãe, que é arquiteta, haviam me preparado um banquete pelo simples fato de eu ter aceito o convite. Após o jantar, a mãe da moça me deu um jogo de cristal caríssimo. Eu perguntei o porquê do presente, e ela me disse: “Quando alguém entra em minha casa, torna-se meu amigo e nunca sai sem levar algum presente.”

Quando estive no Azerbaijão, de início me disseram que eu não podia falar de Jesus. A semana de evangelismo não estava indo bem e resolvi mudar o foco na terça-feira, falando da volta de Cristo, do batismo e outros temas “proibidos”. Então, o povo começou a aparecer e lotou o auditório. No fim, batizamos oito pessoas e cerca de 50 muçulmanos aceitaram a Jesus no apelo final.

Nas capitais há mais abertura para a pregação cristã. De qualquer forma, o mais importante, ao lidar com os muçulmanos, é desenvolver a amizade sincera. E nesse ponto, o brasileiro leva vantagem, com seu estilo aberto e descontraído.

Como era a evangelização adventista nos tempos da “Cortina de Ferro”?

Era muito difícil. Muitos irmãos foram presos e enviados para a Sibéria, principalmente pelo fato de imprimir e espalhar livros. Mas havia o chamado “programa subterrâneo”, que consistia em produzir literatura secretamente. Funcionava assim: um adventista de outro país levava as lições, meditações e livros para um líder adventista na ex-União Soviética, num encontro em restaurantes, por exemplo. Lá, “esquecia” a maleta com literatura e ia embora. Os impressos eram então traduzidos, copiados e enviados para pessoas-chave em cada país, a fim de que elas reproduzissem a literatura. Esse trabalho era feito debaixo de mesas cobertas com cobertores, para abafar o ruído das máquinas de escrever. Eram usadas de dez a doze folhas de papel com papel carbono entre elas, e as teclas da máquina eram apertadas com força, a fim de se produzir várias cópias da mesma página. Depois, eles furavam as folhas, costuravam, colavam à mão e distribuíam os livros para os interessados e para os irmãos da igreja.

Muitos desses “valdenses modernos” trabalhavam como fotógrafos, e ao visitar os lares, percebendo interesse, deixavam a literatura. Os taxistas adventistas faziam, e ainda fazem, o mesmo nos países muçulmanos: ao conversar com os clientes, se percebem interesse, deixam algum impresso.

Em 1999, a editora adventista russa em Moscou inaugurou uma nova rotativa e convidou os antigos copiadores de literatura. Foi uma cena que jamais vou esquecer. Lá estavam aqueles velhinhos, com suas antigas máquinas de datilografar, em volta da moderna impressora. Foi feita uma oração e pediram que um dos idosos apertasse o botão para iniciar a impressão. Foi impossível não chorar.

Durante o tempo do Comunismo, quando muitos adventistas foram enviados para as prisões da Sibéria, mesmo com todas essas dificuldades, houve intensa atividade do Ministério de Publicações.

Como avalia seu tempo de trabalho na Divisão Euro-Asiática?

A barreira da língua foi um grande desafio. Também não foi fácil deixar os filhos longe, no Brasil. Mas tivemos o privilégio de distribuir mais de 8 milhões de livros e publicar literatura em cada um dos 12 países da Divisão, o que era um sonho. E Deus nos permitiu ver esse sonho realizado. Hoje, não se consegue importar livros da Rússia para esses países, devido aos impostos e à cultura. Por isso, é uma bênção poder imprimi-los em cada país. Conseguimos, também, implantar uma biblioteca em cada igreja, mesmo na Sibéria. Os membros lêem, emprestam e muitos se convertem pela leitura. Portanto, foi um privilégio trabalhar naquela Divisão.

Experiências marcantes...

Uma foi a semana de reavivamento e colheita na capital do Casaquistão. Entre os que haviam atendido ao apelo estava uma menina de 17 anos, que dizia: “Pastor eu quero ser cristã adventista, mas meu pai morreu e meus parentes são todos contra. Quero ser batizada, o que faço? Devo ou não ser batizada?” Eu disse que ela deveria decidir e que o Espírito Santo deveria dar a resposta. Oramos e, na noite seguinte, ela voltou feliz, dizendo que tinha duas ótima notícias: sua mãe, pela primeira vez, havia deixado de ser contra sua decisão e havia ido à igreja naquela noite. Cumprimentei aquela senhora e nos tornamos amigos. A outra notícia a moça me deu em particular, perguntando: “O senhor poderia me batizar?” Tive o privilégio de batizá-la no sábado seguinte.

Outra história aconteceu nas montanhas ao sul da Sibéria. Uma colportora (vendedora de literatura religiosa, educacional e de saúde) visitou uma senhora de 78 anos de idade. Era o dia do aniversário da senhora e ela havia pedido um presente a Deus. Quando as colportoras entraram na casa dela e começaram a apresentar os livros, ela disse que, antes, queria apresentar algo a elas. E começou a pregar sobre o sábado. As moças perguntaram como ela havia compreendido isso e foram informadas de que 45 anos antes aquela senhora havia sido batista mas, estudando a Bíblia, acabou descobrindo o mandamento do sábado e começou a guardá-lo. Foi afastada da igreja, mas continuou observando o sábado sozinha, por todos aqueles anos. Quando a colportora disse que também guardava o sétimo dia, aquela mulher chorou de emoção. Quando a visitei, ela quis saber quantos guardadores do sábado há no mundo e eu disse que são mais de 15 milhões de adventistas. Foi uma alegria só. Hoje, há um pequeno grupo que se reúne na casa dela.

No norte da Sibéria há uma igreja que se reúne num vagão de trem. Fui o primeiro adventista estrangeiro a visitar a região. Você entende o que é se reunir num vagão de metal com temperaturas de 30, 40 graus negativos? Quando eu lhes disse que estava indo para a Associação Geral (foi lá que soube do chamado), prometi que pediria ajuda para eles. Perguntei: De que vocês mais precisam aqui? Eles apontaram para o vagão e disseram: “Pastor, igreja nós já temos; o que precisamos é de uma escola. Temos idosos, casados e crianças em nossa igreja, mas quase não temos jovens. Os jovens vão para as escolas que ainda seguem a filosofia comunista e acabam saindo da igreja. Queremos que nossos jovens fiquem na igreja.”

Prometi, então, fazer uma campanha em favor daqueles irmãos e desenvolvemos um site para isso (http://projetosiberia.bravehost.com).

Como se sentiu ao receber o chamado para a Associação Geral?

De início, fiquei em estado de choque, pois é uma missão muito grande. “Será que estou preparado?”, pensei. Mas é animador pensar que, de alguma forma, poderei ajudar muitos países que ainda não têm literatura adventista na própria língua. De certa forma, tenho que repetir a experiência da Divisão Euro-Asiática, mas agora em âmbito mundial. E tenho certeza de que poderei contar com o apoio e as orações de meus irmãos brasileiros.


Pastor Wilmar Hirle e Michelson Borges com um dos livros produzidos à mão por adventistas, no tempo da "cortina de ferro"